Presidente da França atiça disputa retórica entre Roma e Paris por causa da emergência humanitária no Mediterrâneo
ANSA
O presidente da França, Emmanuel Macron, afirmou neste sábado (23) que a Itália “não passa por uma crise migratória”. “Quem diz isso está mentindo”, declarou, após um encontro com o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez.
As declarações são mais um ingrediente na disputa retórica entre Roma e Paris por causa da emergência humanitária no Mediterrâneo, agravada pela decisão do novo governo italiano de fechar seus portos para navios de ONGs que resgatam pessoas no mar.
“É necessário sermos claros e olhar as cifras. A Itália não está vivendo uma crise migratória como acontecia até o ano passado”, declarou Macron.
Segundo dados do Ministério do Interior italiano, 16.316 deslocados externos desembarcaram nos portos do país em 2018, o que representa uma queda de 77,34% em relação ao mesmo período de 2017.
A inversão na rota se deu após o programa do último governo da Itália para treinar e equipar a Guarda Costeira da Líbia, que passou a realizar operações de socorro no Mediterrâneo. “Vivemos mais uma crise política, causada por extremistas que apostam no medo. Mas não podemos ceder ao espírito de manipulação ou supersimplificação dos nossos tempos”, acrescentou Macron, um dia após ser chamado pelo ministro do Interior da Itália, Matteo Salvini, de “senhorzinho educado que se excede no champanhe”.
Cúpula
A crise no Mediterrâneo será tema de uma reunião informal de 16 países da União Europeia neste domingo (24), em uma tentativa de encontrar um caminho único antes da cúpula do Conselho Europeu, em 28 e 29 de junho.
Segundo Macron, França e Espanha devem propor a criação de “centros fechados” nos países de primeiro acolhimento, ou seja, as nações mediterrâneas, como Itália, Grécia e Malta. Tal medida é criticada por organizações de direitos humanos, por impedir a livre circulação de solicitantes de refúgio, que é garantida pela Convenção de Genebra, de 1951.
Além disso, Paris e Madri reforçarão que os deslocados externos resgatados no mar devem ser levados para o “porto seguro mais próximo”, de acordo com as normas internacionais. Neste sábado, a Espanha socorreu 569 pessoas que estavam em 21 embarcações clandestinas no Mediterrâneo Ocidental, perto da Andaluzia.
Enquanto isso, um navio da ONG alemã Lifeline com 239 deslocados aguarda a indicação de um porto seguro para ancorar. A Itália não quer receber a embarcação e passou a responsabilidade para Malta, que diz não ter coordenado o resgate.
Números
Em toda a União Europeia, os países que mais abrigam deslocados externos em relação a sua população, de acordo com o último relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), são:
Suécia (292,6 mil, 2,92%)
Malta (9.378, 2,03%)
Áustria (171,5 mil, 1,95%)
Chipre (15 mil, 1,76%)
Alemanha (1,4 milhão, 1,69%)
Grécia (83,2 mil, 0,77%).
A Itália (354 mil, 0,58%) é a 11ª colocada, atrás ainda de Dinamarca (39,9 mil, 0,69%), Holanda (109,6 mil, 0,64%), Luxemburgo (3,5 mil, 0,59%) e França (400 mil, 0,59%). Já os Estados-membros que menos acolhem são Portugal (1.668, 0,01%), Eslováquia (949, 0,01%), Croácia (919, 0,02%), Romênia (5.464, 0,02%) e Estônia (455, 0,03%).