“Troco a vida do meu marido pela sua mãe”. A exigência de Yadira Guillermo, mulher de Isauro de Paz, que foi sequestrado no Estado de Guerrero, no sul do México, elevou a um novo patamar a escalada de violência e insegurança na região.
Os moradores da pequena cidade de San Miguel Totolapan, no norte do Estado, pegaram em armas no começo da semana para enfrentar o crime organizado.
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Guerrero é o Estado mais violento do México, onde a pobreza é endêmica e o narcotráfico controla plantações de papoula para a produção de heroína nas regiões montanhosas.
Diferentemente de outros casos no país em que pessoas se organizam e formam as chamadas patrulhas de autodefesa ou milícias, neste caso a população tomou uma atitude mais radical.
A mãe de Raybel Jacobo de Almonte, chefe de uma facção criminosa conhecida como Los Tequileros, foi feita refém pela milícia de San Miguel Totolapan para forçar a troca por Isauro de Paz.
O grupo Los Tequileros surgiu de uma cisão do cartel La Familia Michoacana, que controlava a região conhecida como Tierra Caliente (Terra Quente, em espanhol) de Guerrero.
“Assim que entregarem meu marido, devolverei sua mãe. Mas o quero são e salvo”, diz Yadira Guillermo, em um vídeo divulgado na imprensa e na internet.
E Yadira cumpriu o prometido na última quarta-feira, quando seu marido chegou vivo à cidade.
A milícia também entregou a refém, mas à polícia do Estado.
Os criminosos do El Tequilero prometeram vingança e ameaçam atacar a cidade.
Cidade em pé de guerra
Guerrero é o terceiro Estado mais pobre do México. Segundo as autoridades locais, nos primeiros 10 meses deste ano foram registrados 1.832 homicídios, 62 sequestros e 178 casos de extorsão.
“Já não estamos dispostos a continuar como espectadores e indiferentes a tanto derramamento de sangue”, disse em outro vídeo um homem com o rosto coberto, que se apresentou como porta-voz do Movimento Totolapense pela Paz.
“Cansados de tanta insegurança, de tanto medo, de tantas injustiças e humilhações, sequestros, extorsões e tantas mortes injustas, de familiares, vizinhos, irmãos, decidimos levantar a voz e dizer às pessoas que já basta”.
A situação é tensa em San Miguel Totolapan, pois teme-se que os criminosos dos Tequileros cumpram as ameaças e haja represálias.
Diante da possibilidade de um conflito armado entre as brigadas populares e os narcotraficantes, foram enviados para a cidade 220 homens das forças de segurança pelo Grupo de Coordenação Guerrero (GCG), um conselho de segurança formado por representantes do governos federal e estatal.
Negociações tensas
“É um processo muito delicado. Quando se trata de um sequestro é sempre assim, cada minuto conta”, disse o porta-voz do GCG, Roberto Álvarez, à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
Além da mãe do traficante Raybel Jacobo, a milícia capturou 23 pessoas, as quais acusou de ter ligações com os Tequileros.
Uma negociação, mediada pelas autoridades de Guerrero, permitiu que cinco dessas pessoas fossem libertadas.
O governador de Guerrero, Héctor Astudillo, considera a situação “preocupante” e diz que as autoridades querem evitar um “confronto”.
“Vamos tentar resolver isso com cautela, com inteligência, mas esse também é um assunto que deve ser encerrado. Não é possível que cada vez que alguém resolva fazer um sequestro, simplesmente sequestre”, afirmou o governador em uma entrevista coletiva.
Governo estadual admite falhas
O grupo de negociação colaborou com Yadira Guillermo para chegar a um acordo com os sequestradores nos telefonemas em que exigiam resgate, disse Álvarez.
As autoridades asseguram que os 120 militares, 60 policiais federais e 40 policiais do Estado enviados para a região montanhosa de San Miguel Totolapan estão prestes a prender o líder dos Tequileros.
As autoridades sabem que em San Miguel Totolapan “há um grande cultivo de psicoativos, especialmente papoula e maconha”, o que provoca uma disputa acirrada por territórios entre as facções de narcotraficantes.
“Os grupos criminosos precisam de dinheiro e recorrem ao sequestro e à extorsão”, disse o porta-voz do GCG.
O governador do Estado admite que “lamentavelmente a situação degenerou-se para um conflito que foi crescendo” e que provoca “uma sensação justificada” da população de que está indefesa diante dos criminosos.
Yadira Guillermo foi a única pessoa que se atreveu a mostrar o rosto nos vídeos divulgados pela comunidade, mas sabe do risco que ela e os milicianos correm.
“Por tudo o que a minha família passou e por todo o grupo que aqui está, eu responsabilizo você, senhor Héctor Astudillo, já que nunca fez nada por essa gente. Fez vista grossa. Já estamos cansados”, disse ela, contendo as lágrimas no vídeo, para o governador de Guerrero.