López Obrador, que toma posse em dezembro, detalhou pacote de medidas de austeridade
O Globo
O presidente eleito do México, Andrés Manuel López Obrador, começou a desenhar as linhas mestras de seu plano de austeridade após duas semanas de uma vitória arrasadora nas urnas. Ele anunciou, no domingo, 50 ações — entre elas reduzir seu salário em 60% — para combater a corrupção e pôr fim aos excessos da burocracia do governo. As medidas permitirão que o líder do Morena (Movimento de Regeneração Nacional) cumpra suas principais promessas de campanha. Ele tomará posse em 1º de dezembro.
Segundo o anúncio, o salário de López Obrador na Presidência passará dos 270 mil pesos mensais (US$ 14 mil) que o atual presidente do México, Enrique Peña Nieto, recebe, para 108 mil (US$ 5,7 mil). É o primeiro passo para fazer valer um artigo constitucional que hoje é letra morta porque determina que ninguém do governo pode ganhar mais do que o presidente. É também a primeira medida para que o Morena se fortaleça politicamente e empreenda uma agenda de mudanças profundas no início de 2019.
O grupo que fará parte do gabinete de López Obrador começou a afiar as tesouras que permitirão cortes importantes no governo federal. Os próximos ministros já anunciaram algumas das subsecretarias que irão desaparecer. O governo eleito pretende cortar mais de 6 mil cargos no alto escalão, o que geraria, segundo cálculos do Morena, uma economia mensal de 863 milhões de pesos (US$ 45,6 milhões).
Entre as medidas que serão tomadas estão reduzir à metade os salários de todos os funcionários que recebem mais de um milhão de pesos por ano (US$ 52 mil); cancelar as pensões dos ex-presidentes; limitar as despesas de viagem de servidores; suprimir a assistência médica privada, para economizar 256 milhões de pesos (US$ 13 milhões) por ano; limitar as viagens ao exterior; excluir os guarda-costas e proibir voos em aviões ou helicópteros particulares. Serviços de consultoria também serão dispensados. Já o número de assessores por ministro se restringirá a cinco.
A lista de boas intenções exige do próximo Congresso duas reformas urgentes. A primeira é na Lei Orgânica da Administração, para modificar as estruturas dos ministérios e seus cargos. A segunda, talvez a mais importante, é a reforma do artigo 127 da Constituição, que regula o teto salarial dos servidores.
— Esse é o eixo do programa de austeridade — afirmou o deputado eleito Mario Delgado, cotado para liderar a bancada do Morena na Câmara junto com outros ex-legisladores veteranos, como Pablo Gómez, Dolores Padierna e Alfonso Ramírez Cuéllar.
Uma iniciativa para reformar o artigo citado, que deveria ter sido modificado há oito anos por meio de uma lei ordinária, pretende reduzir a abismal brecha salarial — em alguns casos de até 17 ou 18 vezes — que existe entre os altos cargos do Executivo e os funcionários a eles subordinados. O juiz que preside o Supremo mexicano, por exemplo, com seus quase sete milhões de pesos anuais (US$ 370 mil), ganha em um dia o mesmo que um chefe de departamento recebe em um mês.
Os deputados buscam implementar uma regra de proporcionalidade salarial que evite que a diferença entre a remuneração do chefe e a do funcionário exceda 12 vezes. Essa medida permitirá que López Obrador economize 156 milhões de pesos (US$ 8 milhões).
Governo toma forma
Desde a última semana, o ganhador das eleições de 1º de julho vem dando forma ao que será seu governo. Na terça-feira, López Obrador se reuniu a portas fechadas com os parlamentares eleitos do seu partido, que controlarão tanto a Câmara de Deputados quanto o Senado.
Um deputado que compareceu ao encontro relatou as diversas reivindicações e agendas discutidas pelos parlamentares. Entre elas, a de uma parlamentar do Estado do México, que pediu ao presidente eleito, durante oito minutos, para resolver, com urgência, o problema do lixo em um populoso município vizinho à Cidade do México.
O presidente eleito se transformou em um grande bastião da esperança mexicana. Não são apenas os cidadãos comuns que peregrinam até a chamada “casa de transição” de Obrador com a esperança de obter um emprego ou alguma ajuda econômica. Os representantes populares também recorrem a ele, por enxergá-lo como um todo-poderoso que pode consertar os problemas do país.
Recentemente, falou-se em legalizar a maconha, discutir a eutanásia e preparar um novo projeto de Constituição. No entanto, López Obrador pediu a seus legisladores para evitar agendas que polarizem.
— Não abusemos da maioria — disse ele a deputados e senadores aliados, que formarão uma legislatura de histórica maioria em 1º de setembro.
Obrador pediu que seus correligionários se concentrem na agenda prioritária: a de combate aos excessos dos políticos e a promoção do que ele chama de austeridade republicana. O político leu a cartilha aos integrantes de seu partido que irão para o Congresso.
— Não será mais do mesmo. Nada de politicagem, nada de política nos velhos moldes da política tradicional. Esse modelo desmoronou no dia 1º de julho. As pessoas não querem políticos corruptos, prepotentes, fantoches, falsos e mentirosos. Há que se ter isso em mente. Não vão fazer bobagens, porque serão reprovados pela população — disse.