[:pb]Correio Braziliense
Vitoria Cleaver -Embaixadora, presidente da Associação dos Diplomatas Brasileiros
Para que serve um diplomata? Representar, negociar, informar e proteger nacionais são as funções clássicas do diplomata. Uma diplomacia competente e atuante traz prestígio para um país. A diplomacia é fonte de poder suave e inteligente, capaz de superar limitações de poder militar ou econômico e obter vantagens para seu país no cenário internacional. Como seria o Brasil sem sua diplomacia? Basta olhar o mapa: sem diplomatas como Alexandre de Gusmão e Barão do Rio Branco, não teríamos hoje nosso imenso território, com 15 mil km de fronteiras juridicamente reconhecidos por todos os nossos 10 vizinhos.
Sem nossa diplomacia, não teríamos o equilíbrio estratégico na América do Sul, região de paz, desenvolvimento e integração. O Brasil estaria fora de acordos políticos, comerciais, educacionais, culturais, de defesa, investimentos, cooperação técnica, científica e tecnológica. Não teria participado do sistema das Nações Unidas, do processo de descolonização e da atual construção de um mundo multipolar marcado por novas alianças e blocos como Mercosul, Unasul, Celac, Brics e G-20.
Se o Brasil é hoje reconhecido como ator global, líder com autoridade moral na definição de grandes temas, cujas opiniões são consideradas tanto pelas grandes potências quanto pelos países menos desenvolvidos, isso se deve à excelência de nossa atuação diplomática. A imagem distorcida dos punhos de renda demonstra desconhecimento do trabalho real do diplomata. Ele atua com a mesma competência e afinco tanto na ONU, em Nova York, quanto ao ar livre em situações de terremotos, catástrofes naturais e crises políticas; dialoga com estadistas, empresários, sindicalistas, acadêmicos, jornalistas, estudantes, refugiados, sacerdotes de todas as religiões, enfim, com todos os interlocutores necessários para defender os interesses do país e do cidadão brasileiro, em várias línguas, culturas e regiões.
O diplomata pertence a uma carreira de Estado, e sua visão é de longo prazo. Antes da criação do Instituto Rio Branco, que completa 70 anos em 2015, o ingresso na carreira já se dava por concurso público. Sem perder o alto nível de exigência do concurso, dos mais difíceis do Brasil, o acesso à carreira tem-se democratizado com a realização dos exames nas principais capitais e com iniciativas de ação afirmativa.
Não se improvisa diplomacia. No Brasil, ela é resultado de uma sólida base institucional. O Brasil é um dos raríssimos países nos quais 100% dos cargos diplomáticos são ocupados por quadros de carreira, sem indicação política, o que assegura credibilidade, coerência e profissionalismo.
Ao negociar acordos comerciais e de investimentos ou defender a posição brasileira na Organização Mundial do Comércio, diplomatas abrem oportunidades de mercado e vencem causas cujo impacto real, em termos de benefícios econômicos e de emprego, não é contabilizado. Se o fosse, certamente demonstraria a discrepância entre o pequeno valor que se gasta na ação diplomática e os amplos benefícios auferidos por empresas e pela sociedade brasileira.
Esse ponto conduz à dramática situação orçamentária pela qual passa o Itamaraty. Seu orçamento representa algo em torno de 0,1% do Orçamento da União (um dos ministérios menos aquinhoados da Esplanada), sistematicamente reduzido e contingenciado, com uma despesa em grande parte contabilizada em dólares. A diplomacia tem-se sentido desvalorizada, e com razão: embaixadas não conseguem pagar contas, diplomatas atrasam aluguéis, organismos internacionais não recebem pagamentos devidos. Por maiores que sejam a dedicação, o empenho e o compromisso pessoal dos diplomatas, a penúria material tem transmitido uma imagem constrangedora aos nossos parceiros, incompatível com a grandeza do Brasil.
É nesse contexto adverso que a Associação dos Diplomatas Brasileiros completa 25 anos. Conscientes de que precisam lutar pelo Itamaraty e por seus direitos, os diplomatas estão criando um sindicato próprio. A diplomacia brasileira precisa ser novamente valorizada pelo governo e pela sociedade.
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