A paralisação de 24 horas foi convocada pela opositora Aliança Nacional pela Justiça e Democracia, que agrupa empresários, estudantes e setores da sociedade civil
Agência France-Presse
A Nicarágua amanheceu nesta quinta-feira, 14/6, em greve geral convocada por uma aliança opositora para pressionar o Daniel Ortega a cessar a repressão contra as manifestações populares que se intensificou nas últimas semanas e já deixou 157 mortos em quase dois meses de protestos.
Em Manágua, a paralisação parecia geral, com ruas desertas, alguns ônibus de transporte público circulando vazios e a presença policial em vários pontos da cidade, observou a AFP.
A paralisação de 24 horas foi convocada pela opositora Aliança Nacional pela Justiça e Democracia, que agrupa empresários, estudantes e setores da sociedade civil, como forma de pressionar o governo para interromper os ataques violentos contra manifestantes e a população, realizados por forças antichoque e “turbas” pró-governo.
A Nicarágua vive um clima permanente de protestos, que deixou suas principais vias e cidades semiparalisadas, desde os protestos de rua iniciados em 18 de abril contra uma fracassada reforma previdenciária.
Contudo, os protestos se estenderam como mostra de insatisfação com o governo de Ortega, que desde 2007 governa com sua esposa Rosario Murillo como vice-presidente e braço direito, acusado de autoritarismo e de controlar os poderes do Estado.
Supermercados, lojas, postos de gasolina e pequenas vendas em Manágua também não abriram suas portas, enquanto nos colégios públicos os professores ficaram esperando os alunos.
“Está tudo deserto, a população está apoiando a greve”, disse o taxista Pablo Ramírez, que desistiu de trabalhar por falta de passageiros.
O mercado popular oriental de Manágua, com mais de 20 mil negócios e 2 mil vendedores ambulantes, que começam a trabalhar ainda de madrugada, estava abandonado, cercado por barricadas para tentar proteger eventuais roubos e saques.
“O mercado está apoiando a paralisação, a esta hora muitas lojas estariam abertas, mas como se vê está totalmente fechado”, disse à AFP Liliam Gámez, funcionária de loja turca que foi trabalhar a pedido de seu patrão.
“A paralisação é para pressionar o governo a se sentar e dialogar para dar uma solução a essa crise”, disse à AFP Heriberto Ruiz, vendedor de doces do mercado. “Que Ortega saia pela porta da frente, e não pela dos fundos”, afirmou Ruiz, que acredita que a Nicarágua se tornou uma “terra de ninguém” com a violência e os roubos.
Tiroteios e mortes
A paralisação foi precedida por novos ataques na capital e na Universidade Autônoma da Nicarágua (Unan), uma trincheira dos estudantes que protestam contra o governo, de acordo com a oposição. Também houve confrontos nas cidades de Jinotepe, Diriamba, León, Nagarote e Masatepe.
Nesta última, no estado de Masaya, ataques de grupos paramilitares “deixaram quatro mortos e diversos feridos”, disse à AFP o secretário-geral da Associação Nicaraguense Pró-Direitos Humanos (ANPDH), Alvaro Leiva.
Já em Masaya, três motos com paramilitares armados entraram na cidade e “dispararam sobre as trincheiras”, deixando um baleado, indicou. A polícia deste antigo bastião oficialista continua sitiada com barricadas defendidas por jovens com pedras e morteiros caseiros.
Golpe econômico
“A economia produz 35 milhões de dólares diários, pode ser que nem tudo se paralise porque há atividades que não podem ser interrompidas”, explicou Mario Arana, diretor da Associação de Produtores e Exportadores da Nicarágua (Apen). Assim, ele estima que o país deixe de produzir entre 25 e 35 milhões de dólares em um dia de paralisação. O setor privado, outrora aliado de Ortega, rompeu a aliança em meio aos violentos protestos.
Desde o início da onda de protestos, em 18 de abril, o balanço de vítimas é de 157 mortos e mais de 1.300 feridos, segundo o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh). Até a Igreja católica, mediadora no diálogo entre o governo e a oposição, acolheu a convocação de paralisação.
Com a crise sociopolítica, estimativas não oficiais esperam uma queda de 1% do PIB, que, em termos de valor, chega a 800 milhões de dólares. A Conferência Espiscopal da Nicarágua (CEN) convocou nesta sexta-feira, 15/6, uma sessão de mesa plenária do diálogo para revelar a resposta de Ortega a sua proposta de democratização.