A gestão da pandemia no país preocupa a comunidade internacional e é destaque em jornais pelo mundo afora. “O Brasil não para de registrar tristes recordes na progressão da pandemia”, relata a emissora France Info em seu site, que traz nesta quarta-feira (20) o último balanço da evolução da doença no país. “Mas os dados divulgados até agora seriam subestimados, já que não há testes suficientes no país e o número real de doentes poderia ser 15 vezes maior”, alertam os jornalistas franceses.
O jornal Le Parisien é mais categórico e diz que se esse ritmo de contaminação continuar, “o Brasil poderá registrar uma aceleração da pandemia”. Fora da França, o jornal britânico The Guardian fala dos hospitais saturados no Rio de Janeiro e São Paulo e lembra que o Brasil já ultrapassou o Grã-Bretanha e se tornou o terceiro país com o maior número de infecções confirmadas. Já o canal de televisão norte-americano CNN critica a posição do presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que “continua descartando a ameaça do vírus, dizendo que quarentena e bloqueios podem ter um impacto pior na economia brasileira”.
Pressão de Bolsonaro para uso da cloroquina
A imprensa internacional também se interessa pela estratégia de tratamentos sugerida por Bolsonaro. “O líder populista apontou a cloroquina como uma droga potencial contra o novo coronavírus – como seu colega americano, Trump”, relata o canal de televisão CNN. O francês Le Parisien completa, explicando que “o presidente é um fervente partidário [do uso dessa molécula], mesmo se sua eficácia não foi provada por nenhum estudo cientifico irrefutável e que a cloroquina pode provocar vários efeitos colaterais, entre eles problemas cardíacos”.
O que chama a atenção da imprensa internacional é que Brasília pretende generalizar o uso da molécula, inclusive em pacientes que desenvolveram uma forma menos severa da doença. “A maioria dos grandes países atingidos pela pandemia, como Estados Unidos e França, autorizaram o uso da hidroxicloroquina, um derivado da cloroquina, apenas como parte de testes clínicos ou em hospitais, para casos graves, após uma decisão coletiva dos médicos”, alerta a revista francesa Le Point em um artigo intitulado “Cloroquina generalizada sob a pressão de Bolsonaro”.
Mesmo tom no Courrier International, que relata a piada feita pelo chefe de Estado sobre o tratamento, no mesmo dia em que o país alcançava a barra simbólica de mil mortos vítimas da Covid-19. “Quem é de direita toma cloroquina, quem é esquerda, Tubaína”, ironizou Bolsonaro.
Além da questão de um potencial tratamento, o jornal suíço Le Temps traz uma longa reportagem feita por sua correspondente em São Paulo, que aponta falhas no início da luta contra o vírus no Brasil. “Somente dois meses e meio após a confirmação do primeiro caso, em 26 de fevereiro, São Paulo, o estado mais atingido, anunciou uma política de testes em massa”. Ela ressalta que no restante do país a situação também é difícil, em razão da falta de coordenação dos esforços em uma nação de contrastes e dimensões continentais.
“O Brasil é o único país com mais de 100 milhões de habitantes dotado de uma rede de serviço público de saúde disponível para toda a população”, elogia a correspondente. “Mas esse famoso SUS, do qual dependem 75% dos brasileiros, é cronicamente subfinanciada e já era subdimensionado bem antes da pandemia. As vezes há leitos, mas não há pessoal qualificado”, pondera a jornalista do Le Temps.
Valsa de ministros
O jornal suíço, como váriou outros veículos internacionais, acompanhou a valsa de ministros da Saúde nos últimos dias. Le Temps explica que a pasta está disponível após a saída de Nelson Teich e Luiz Henrique Mandetta, que se recusaram a seguir a estratégia de uso indiscriminado da cloroquina, como tenta impor Bolsonaro. “O próximo titular da pasta deverá se dobrar à essa exigência”, comenta a correspondente do Le Temps . O italiano Corriere Della Serra também fala da dança das cadeiras de ministros e diz em título que “o Brasil vive um caos político”.