O presidente boliviano, Evo Morales, renunciou à Presidência da Bolívia às 18h (horário de Brasília) deste domingo (10), da cidade de Cochabamba, após pressão das Forças Armadas e protestos intensos nas grandes cidades do país.
“Me dói muito que nos tenham levado ao enfrentamento. Enviei minha renúncia para a Assembleia Legislativa Plurinacional”, afirmou em pronunciamento na televisão. Evo, que ficou 13 anos no poder, diz ter sido vítima de “um golpe cívico, político, policial”.
“Quero pedir desculpas por ter sido exigente durante o trabalho. Não foi para Evo, foi para o povo boliviano. Aqui não termina a vida, segue a luta”, disse, encerrando a fala. O vice-presidente Álvaro García Linera, que estava ao lado de Evo durante o pronunciamento, também apresentou sua renúncia.
Evo já havia convocado novas eleições no começo do dia para tentar arrefecer a tensão no país, após três semanas de enfrentamentos violentos que causaram três mortes e deixaram mais de 300 feridos nas principais cidades do país.
O efeito, no entanto, foi inverso, e a crise se intensificou ao longo do domingo. O comandante das Forças Armadas, Williams Kaliman, fez um pronunciamento na TV à tarde, em que sugeria a Evo renunciar a seu mandato para pacificar as ruas.
Por volta das 17h (horário de Brasília), o avião presidencial boliviano decolou do aeroporto de El Alto, em La Paz, onde o presidente estava desde a manhã do domingo, alimentando especulações de que ele poderia estar deixando o país.
Mas a aeronave aterrissou no aeroporto de Chimoré, perto de Cochabamba, um reduto político de Evo.
O anúncio do novo pleito foi feito pelo mandatário na manhã do domingo, depois que o secretário-geral da OEA (Organização dos Estados Americanos), Luis Almagro, pediu a anulação das eleições na Bolívia após auditoria realizada na contagem dos votos.
A tensão vem escalando devido aos enfrentamentos entre apoiadores e críticos de Evo, que o acusam de fraude. Nos últimos dias, houve levantes de policiais e militares que se recusaram a tomar ações de repressão contra opositores, enquanto o agora ex-presidente acusou uma “tentativa de golpe de Estado”.
Os resultados da auditoria da OEA seriam divulgados apenas em 13 de novembro, mas foram adiantados “por conta da gravidade das denúncias”, disse Almagro em um comunicado no qual pedia que a eleição do último dia 20 de outubro fosse “anulada e que o processo eleitoral comece novamente”.
A Bolívia vive uma situação grave nas ruas por conta dos resultados contraditórios divulgados após as eleições de outubro, que conferia um quarto mandato a Evo.
O imbróglio eleitoral ocorreu porque o órgão responsável pela apuração, ao divulgar os resultados do sistema de contagem rápida, indicou resultado, com 80% das atas apuradas, que levava à disputa de um segundo turno entre Evo e Carlos Mesa.
Três horas depois, porém, essa contagem foi interrompida por 24 horas, enquanto se acelerou a contagem “voto a voto”. Quando por fim foram anunciados os resultados, Evo aparecia à frente por pouco mais de dez pontos percentuais de vantagem, o que confirmava a reeleição já em primeiro turno.
Desde o conflito eleitoral, os protestos vêm aumentando em La Paz e em outras cidades, com ataques a casas de autoridades, incêndios e confrontos de rua. O presidente da Câmara dos Deputados da Bolívia, Víctor Borda, também renunciou ao cargo neste domingo após manifestantes atacarem sua casa, em meio às manifestações.
Em intervalo de horas, dois ministros do governo Evo fizeram o mesmo: Luis Alberto Sánchez (Hidrocarbonetos) e César Navarro (Mineração), que abdicou do posto depois que opositores queimaram sua casa.
Mesa, ex-presidente boliviano e candidato de oposição nas eleições de outubro, comemorou a notícia da renúncia no Twitter. “À Bolívia, a seu povo, aos jovens, às mulheres, ao heroísmo da resistência pacífica. Nunca esquecerei esse dia único. O fim da tirania. Agradecido como boliviano por essa lição histórica. Viva a Bolívia!”.
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