As prioridades do novo embaixador do Brasil no Marrocos serão a diversificação da pauta comercial e a assinatura do acordo de livre comércio entre o Mercosul e o país do Norte da África. O nome do diplomata Julio Glinternick Bitelli – que está deixando o posto de embaixador em Bogotá, na Colômbia, onde atua desde 2016 – foi aprovado na semana passada pela Comissão de Relações Exteriores do Senado. Sua expectativa é assumir a embaixada em Rabat em setembro.
“A pauta comercial entre Brasil e Marrocos é demasiadamente concentrada em alguns poucos produtos. O Brasil basicamente compra fosfato e derivados de fosfato, e vende alguns produtos agrícolas, sobretudo milho e açúcar”, disse Bitelli à ANBA. Ele visitou a Câmara de Comércio Árabe Brasileira, em São Paulo, nesta segunda-feira (01). De janeiro a maio de 2019, o Brasil exportou o equivalente a US$ 176,8 milhões ao Marrocos, e comprou US$ 289,8 milhões em produtos marroquinos. Os dados são da Câmara Árabe.
As tarifas para proteína animal no Marrocos, segundo o embaixador, são muito altas em cima dos produtos brasileiros. A carne bovina é tarifada em quase 200%, enquanto a de frango, em 100%, o que dificulta a competitividade do produto brasileiro.
O fato de o Marrocos ter acordos de livre comércio com vários países produtores de proteína animal, de acordo com Bitelli, faz com que as carnes brasileiras tenham de enfrentar tarifas muito altas. “Temos que trabalhar para diminuir as tarifas e permitir que nossos produtos entrem no mercado marroquino de forma mais competitiva, principalmente as carnes de frango e bovina, que são produtos nos quais o Brasil tem grande tradição de exportação para os países árabes, inclusive na questão do halal, que a gente trabalha muito bem”, declarou o embaixador. São considerados “halal” os produtos adequados ao consumo de muçulmanos.
Bitelli afirmou que uma questão “importantíssima” é o acordo de livre comércio entre o Mercosul e o Marrocos. “É uma negociação que já teve seus primeiros passos, mas que está congelada há bastante tempo, e agora a assinatura do acordo entre o Mercosul e a União Europeia vai permitir que, do lado do Mercosul, haja uma atenção maior para essa negociação com o Marrocos – eles vinham dando prioridade absoluta à assinatura do acordo com a União Europeia. Neste momento, as autoridades marroquinas pediram para analisar os termos e se espera delas uma reação que permita retomar as negociações. Esse é um processo que tem um enorme potencial positivo”, explicou.
A relação entre dois países, disse Bitelli, passa por diferentes áreas que não podem ser desconsideradas. “Então toda a questão da relação cultural, a promoção do Brasil, a cooperação acadêmica, esportiva, educacional, tudo isso vamos trabalhar também”, completou.
O turismo é outro setor que pode se beneficiar do acordo de livre comércio entre o bloco sul-americano e o país árabe. “Existe uma ideia de que as frequências dos voos diretos da Royal Air Maroc para o Brasil (São Paulo e Rio de Janeiro) sejam ampliadas, e eventualmente a inclusão de outros destinos no Brasil, e o acordo assinado dá tranquilidade para que se trabalhe em cima disso”, afirmou.
Bitelli disse ser amigo do atual embaixador do Brasil no Marrocos, José Humberto de Brito Cruz. “Tenho conversado bastante com ele, e isso é muito útil para saber mais ou menos em que pé andam os distintos assuntos na agenda bilateral. Tive a oportunidade de conversar também com o embaixador do Marrocos em Brasília (Nabil Adghoghi), que é um diplomata muito ativo e que tem feito um excelente trabalho, e combinamos de trabalhar muito próximos nas duas pontas desta relação”, declarou.
Tunísia
O primeiro posto de Bitelli como embaixador foi na Tunísia, outro país árabe do Norte da África, onde ficou entre 2013 e 2014. “Tive o privilégio de ser embaixador em Túnis, na Tunísia, e acompanhar a transição democrática no país, a Assembleia Constituinte, a adoção da Constituição, que é uma Constituição moderna e liberal, que estabelece igualdade absoluta entre homem e mulher, liberdade de culto e de associação; acompanhei também a primeira eleição direta para presidente da República da Tunísia, e ver essa grande vontade popular de modernização, de pertencimento a uma sociedade mais aberta – é algo que vejo que há em outros países árabes -, foi uma experiência fantástica”, contou.
Em relação ao Marrocos, o embaixador afirmou serem dois países com muito em comum, embora tenham dimensões distintas. “Dois países mediterrâneos que têm essa tradição de multiculturalidade, que é importante, uma tradição de abertura ao mundo, de tolerância religiosa, isso eu vi na Tunísia e também são características que marcam o Marrocos, que acredito que são fundamentais, e que geram para um embaixador do Brasil uma facilidade de interlocução”, disse.
Bitelli falou que o Brasil dispõe de um “manancial de boa vontade” nesses países. “Há uma admiração pelo Brasil, uma vontade de fazer coisas, uma enorme demanda, isso eu vi na Tunísia e tenho certeza que também está presente no Marrocos”.
Muito entusiasmado com a possibilidade de voltar ao Magreb (região no Norte da África que engloba Líbia, Tunísia, Argélia, Marrocos e Mauritânia), Bitelli afirmou que irá trabalhar com uma relação muito importante em um país que tem papel de relevância na África, e que tem com o Brasil “um potencial de ampliação das relações, que é um desafio para qualquer embaixador”.
Bitelli foi recebido na sede da Câmara Árabe pelo secretário-geral, Tamer Mansour, pelos vice-presidentes Osmar Chohfi (Relações Internacionais), Mohamed Mourad (Administrativo) e Ruy Cury (Comércio Exterior), pela gerente de Relações Institucionais, Fernanda Baltazar, e pela diretora de Marketing da entidade, Janine Menezes.