Presidente vai participar do Fórum Econômico Mundial para tentar atrair investidores estrangeiros ao país. Analistas alertam que não será fácil
Rosana Hessel
O presidente Jair Bolsonaro confirmou a ida ao encontro anual do Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês), no fim do mês, quando estreará no principal palco da elite global, em Davos, na Suíça. A expectativa é grande sobre a mensagem que o chefe do Executivo pretende transmitir no evento que reúne os maiores líderes e investidores do planeta. Analistas avaliam que ele precisa saber muito bem que recado passar ao público.
Bolsonaro tentará atrair investidores estrangeiros ao Brasil para decolar seu programa de privatizações. Os primeiros dias mostraram que a equipe econômica chefiada por Paulo Guedes tem um bom diagnóstico dos problemas do país e inspira confiança ao mercado.
O WEF será também o primeiro teste de Bolsonaro em um ambiente totalmente diferente ao que ele está acostumado. Acompanhado pelos ministros Paulo Guedes, Onyx Lorenzoni (Casa Civil) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Bolsonaro fará discurso para cerca de 1,1 mil empresários, investidores e chefes de Estado. Pretende falar, sobretudo, de economia.
Temas sensíveis precisarão ser tratados com cautela, como recomenda a diplomacia. Qualquer sinalização brusca de saída do Acordo de Paris, como fez os Estados Unidos, ou sobre a transferência da embaixada de Jerusalém para Tel Aviv, em Israel, pode fechar muitas portas para o Brasil, alertam analistas.
Segundo eles, Bolsonaro está sendo criticado por possíveis mudanças nas demarcações de terras indígenas e por declarações sobre a revogação do acordo de imigração da Organização das Nações Unidas (ONU). Eles lembram que o Brasil não tem a mesma força política e econômica dos Estados Unidos, portanto, não dá para querer ditar regras onde o país não tem voz muito ativa e por representar uma fatia pequena das exportações globais (1,2%).
“Bolsonaro tem duas missões em Davos. A primeira é mitigar a imagem ruim que a imprensa internacional, e até mesmo os conservadores, tem dele. A segunda é atrair investidores e mostrar que o país está aberto para negócios”, explica o consultor Welber Barral, da BMJ Consultores. Ele afirma que tem um cliente republicano norte-americano que considera o brasileiro mais radical do que Donald Trump, presidente dos EUA. “Até o Trump se comportou em Davos”, destaca.
Polêmica
Para a economista Monica de Bolle, diretora de estudos latino-americanos de mercados emergentes da Johns Hopkins University, de Washington, Bolsonaro precisa alinhar seu discurso ao do ministro Paulo Guedes, que agrada ao mercado, e evitar os temas mais polêmicos para não sair com as intenções frustradas do resort nos Alpes suíços. “Como é a primeira aparição internacional de Bolsonaro, ele precisará repetir o discurso do Paulo Guedes. Abertura econômica é o que interessa”, explica.
Monica alerta que o pessoal do WEF não vai querer ouvir o discurso de Ernesto Araújo, ministro de Relações Exteriores. Todas as atenções estarão voltadas para o ministro da Economia. “Guedes é mais seguro e vai falar o que o investidor quer ouvir”, resume.
Na avaliação de Monica, o mercado vai dar um voto de confiança por um bom tempo para o novo governo, mas o entorno de Bolsonaro está gerando dúvidas desnecessárias, porque há diferentes grupos de interesses que podem atrapalhar o avanço da reforma da Previdência e das privatizações. “Existe um potencial de isolamento de Paulo Guedes. Haverá embates com esses grupos de apoio, como militares e evangélicos. Mas, se o ministro da Economia conseguir dar continuidade ao ajuste fiscal, fazendo, inicialmente, uma reforma profunda da Previdência e dos bancos públicos, poderá estender o clima favorável”, aposta.
Reunião de líderes
O Fórum Econômico Mundial é uma organização sem fins lucrativos baseada em Genebra, porém, mais conhecido por suas reuniões anuais em Davos, Suíça. Reúne os principais líderes empresariais e políticos, intelectuais e jornalistas para discutir as questões globais mais urgentes, incluindo saúde e meio ambiente. Foi fundado em 1971 por Klaus M. Schwab, um professor suiço de administração. Além das reuniões, o Fórum produz vários relatórios de pesquisa e engaja seus membros em iniciativas setoriais específicas. Este ano, será realizado entre 22 e 25 de janeiro e deve reunir cerca de 250 presidentes e chefes de governo e mais de 1 mil empresários.
Chance de aparecer na vitrine global
Entre os países da América Latina, o Brasil perdeu o protagonismo no Fórum Econômico Mundial desde o fim da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, que surfou na popularidade em Davos até a crise financeira global de 2008 e 2009. Para o consultor Welber Barral, da BMJ Consultores, Bolsonaro tem a chance de aproveitar o vácuo deixado pelo México, que vinha sendo o queridinho nos últimos anos, uma vez que o novo presidente, o esquerdista Andrés Manuel López Obrador, não deve chamar muita atenção. “Neste ano, o alinhamento ideológico do ponto de vista econômico dos participantes é maior com o Brasil. O país tem a oportunidade de ocupar um espaço de destaque, se o governo for esperto”, afirma.
São esperados em Davos cerca de 250 presidentes e chefes de governo e mais de 1 mil empresários e executivos das maiores companhias multinacionais, líderes de organizações internacionais e intelectuais. O público não é o mesmo com o qual Bolsonaro está acostumado. “Esse encontro é muito importante para ele ser visto pelo mundo. Mas vai ser um desafio enorme, porque a equipe ainda está muito desafinada e Davos é uma vitrine global. Se não tomarem cuidado, o tiro pode sair pela culatra. Em vez de atrair os investidores, o presidente e seus ministros podem afugentá-los”, alerta o coordenador de graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP), Joelson Sampaio.
Desastre
O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, não participará desta vez. O ministro da Economia, Paulo Guedes, está confirmado, mas há um temor sobre a participação do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Depois do desastroso discurso ideológico de posse, que tremeu as bases do Itamaraty, reconhecidamente neutro em sua diplomacia, a torcida dos analistas é para que o chanceler brasileiro não discurse a fim de evitar um constrangimento maior.
Para o economista José Luis Oreiro, da Universidade de Brasília (UnB), as chances de Bolsonaro dar vexame em Davos são grandes, especialmente, se insistir em se aproximar apenas do presidente norte-americano, Donald Trump, e do primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Isso aumenta a hostilidade com a China e com o Mercosul. “O governo mal começou e mudou a tradição do Itamaraty de ser um centro de conciliação”, pontua.
Oreiro destaca que Bolsonaro pode ficar sozinho nesse radicalismo, porque, em meio às tensões políticas nos Estados Unidos, a possibilidade de o presidente norte-americano sofrer um impeachment não está descartada. Além disso, o novo aliado do presidente brasileiro Netanyahu pode ser preso, pois é investigado por dois processos de corrupção em Israel.