Com cerca de 8.000 fieis registrados, a paróquia mais importante do país faz dez missas aos domingos
Seul, Coreia do Sul – Aos 29, Gabriela Chong ganhou seu nome católico. Batizada, faz parte dos 500 mil coreanos que nos últimos dez anos engrossaram as filas do catolicismo e o tornaram a religião que mais cresce no país dentre os grandes grupos. “Problemas pessoais me levaram a buscar apoio, e foi aqui que o encontrei”, diz Chong, que atende o público na secretaria da catedral Myeong-dong, em Seul.
Com cerca de 8.000 fieis registrados, a paróquia mais importante do país faz dez missas aos domingos e quatro por dia na semana. A cada mês, Chong registra de 70 a 80 novos católicos ali.
Praticamente inexistentes no começo do século 20, as igrejas cristãs coreanas iniciaram um crescimento explosivo na década de 1960, após o fim da Guerra da Coreia, impulsionado pelo trabalho de missões religiosas que ofereceram conforto material e espiritual à população e ajudaram na reconstrução do país.
Desde então, a presença cristã na Coreia dobra a cada década, no ritmo mais acelerado entre todos os países, segundo estudo do sociólogo Andrew Eungi Kim, professor da Universidade da Coreia que pesquisa o cristianismo.
De apenas 8% em 1950, os cristãos passaram a ser 29% (18% protestantes e 11% católicos) na virada dos anos 2010, superando os budistas (23%), segundo o Instituto Pew, dos EUA. Em 2050, pelas projeções do instituto, cristãos serão um terço da população, e budistas, 18%. Os números fazem do país uma das exceções na Ásia, em que apenas 2% são cristãos.
COSTUMES MAIS LIVRES – Desde os anos 1990, porém, igrejas evangélicas perderam fieis enquanto as católicas mantiveram a alta. O censo mostrou queda na fatia protestante entre 1995 e 2005, a primeira desde 1960. No período, a fatia de católicos passou de 4,6% para 11,8%, e cresceu entre homens e mulheres, de todas as idades e níveis educacionais.
Em 2016, os coreanos católicos eram 5,7 milhões, alta de 10% sobre 2010, segundo a Conferência Nacional dos Bispos. Subiu também o número de bispos, padres, paróquias e, principalmente, instituições que servem como canal de transmissão da popularidade da religião no país: escolas, hospitais, clínicas e obras sociais.
Há também motivos subjetivos para preferir o catolicismo. “Há mais liberdade de costumes”, diz Gabriela Chong. A noção de que no catolicismo é mais fácil “obter perdão para os pecados” foi compartilhada por outros sul-coreanos ouvidos pela reportagem.
COMPETIÇÃO – Do lado protestante, as causas do retrocesso estão ligadas ao sucesso que as cerca de 170 denominações obtiveram no século 20, segundo o professor Andrew Kim. Por volta de 1980, quado algumas igrejas já davam sinais de estagnação, houve enorme expansão dos mega templos, escreve o sociólogo.
Essas igrejas se beneficiaram de suas ligações com a ditadura do país, líderes carismáticos, programas de TV e do anonimato que uma congregação gigante possibilita. Com mais fiéis, as receitas cresceram e enriqueceram pastores. Isso impulsionou o total de sacerdotes, muitos interessados apenas em obter um meio de vida rentável.
Além disso, as denominações evangélicas na Coreia seguiram um modelo de fragmentação, em que competem entre si, afirma Kim. As megaigrejas canibalizaram as menores, e a visão mercadológica levou líderes a buscar consumidores, ofuscando ensinamentos religiosos.
Kim também aponta que o protestantismo coreano é “muito conservador, individualista, apocalíptico e materialista”, o que o teria isolado da sociedade ampla. A insistência dos pastores em doações, a passagem de igrejas de pais para filhos e a “venda” de congregações desmoralizaram várias das denominações. Escândalos de corrupção envolvendo pastores famosos jogaram mais lenha na fogueira.
Uma das chamuscadas foi a igreja Yoido do Evangelho Pleno, em Seul, que se anuncia como a maior pentecostal do mundo, com mais de 800 mil fieis -não há levantamento confiável do número. O fundador, David Yonggi Cho, foi acusado por 29 decanos de desfalcar os cofres da igreja em US$ 20 milhões. O processo acabou arquivado.
A Yoido diz receber até 200 mil fieis aos domingos. Quando a reportagem esteve no templo, numa sexta, poucas dezenas participavam de uma cerimônia em um auditório menor. Alguns dormiam nos bancos, outros teclavam em celulares.
Se Young Kim, 38, que recebia inscrições para um curso no templo em Seul, diz que o número de frequentadores vem caindo. “Os mais novos acham que não precisam ir à igreja, basta ser da religião”, diz ela, batizada aos 5 anos quando a mãe se converteu. Ao seu lado, Shin Sang Jo, 27, de pais sem religião, concorda: “Os sul-coreanos não querem mais compromisso. Preferem seguir só o desejo”.
Em 2015, o censo pareceu trazer uma boa notícia para os evangélicos, mostrando a recuperação de sua fatia. Mas demógrafos apontam distorção causada pela adoção de declarações on-line.*A jornalista viajou a convite da Hyundai Com informações da Folhapress.