O embaixador da Grécia no Brasil Yannis Tzovas é também advogado, foi chefe de missão do Chile, na Espanha, Cônsul Geral na Albânia, Vice Representante Permanente da Grécia na União Européia entre outras funções. O diplomata receberá em breve a importante visita do ministro das Relações Exteriores, a primeira de Ministro no Brasil. Na opinião de Tzovas, as relações bilaterais podem ser ainda melhores com ampliação do comércio entre os dois países, do intercâmbio político e das atividades culturais. Leia a íntegra da entrevista.
Como está a situação das fronteiras da Grécia que foram reabertas recentemente?
A situação nas fronteiras da Grécia está controlada e absolutamente normal. No passado havia fluxo de refugiados da guerra da Síria, mas agora as coisas estão muito mais tranquilas. A pandemia fez com que o fluxo de turistas na Grécia baixasse muitíssimo nestes dois últimos anos, mas agora como estamos saindo da pandemia, esperamos outra vez que retome o fluxo de visitantes. E não há nenhuma dificuldade para a entrada de turistas.
Como ficou esse setor tão importante para o país?
A Grécia é um dos países mais turísticos do mundo, somos uma potência mundial. Depois da França, Espanha e Itália, somos o país que mais recebe turistas por ano proporcionalmente à população. No ano pré-pandemia, em 2019, recebemos 33 milhões de turistas e nossa população é de 10 milhões, ou seja, três vezes a população local. Tem países que recebem mais; a Espanha recebe 80 milhões em um ano normal; a França ainda mais, só Paris é um ponto de atração muito forte. Assim, a Grécia se compara a esses países.
Tem que se saber que 19% do Produto Interno Bruto grego deve-se ao turismo. Então o turismo contribui muito com nosso PIB, com a riqueza da Grécia. Compreende-se assim que os últimos dois anos não foram nada bons para nós. Esperamos agora que os brasileiros, que tinham uma taxação de impostos problemática, a qual já foi resolvida, com o cancelamento dos 25% do imposto que era cobrado, possam voltar a nos visitar. Já há um comunicado da Embaixada do Brasil em Atenas que informou às agências de turismo brasileiras e aos brasileiros que queiram ir à Grécia que isso já foi revisto, além disso, os brasileiros não necessitam de visto para ir à Grécia. Agora também todas as restrições foram canceladas, nem mesmo certificado de vacinação é exigido. Estamos tentando aumentar o fluxo de turistas, mas agora, o problema é a conexão aérea Grécia/ Brasil, os brasileiros tem que fazer escala por outros países para chegarem à Grécia.
À frente da missão no Brasil, quais serão as prioridades do senhor?
Eu tenho instruções concretas do meu governo para tentar melhorar três coisas.
A primeira, ampliar as relações comerciais que estão muito baixas. Poderíamos dobrar, até triplicar, aumentar muito o volume do nosso intercâmbio comercial com certeza. Aumentar os investimentos. O Brasil é uma potência mundial, enorme, a 10ª economia do mundo. São 213 milhões de habitantes, a Grécia são apenas 10 milhões. Temos que melhorar nossas exportações com o Brasil. Nós somos o país com a maior frota mercantil do mundo, somos também uma potência mundial em barcos, com armadores, alguns estão navegando aqui no Brasil, o porto de Santos recebe muitos pavilhões gregos. Então a primeira prioridade é relacionada à economia.
A segunda é o intercâmbio político. Não temos nenhuma diferença política, sem contar que a Grécia está integrada à União Europeia que tem boas relações com o Brasil, por isso, a relação do Brasil com a União Europeia afeta também a Grécia. Nós estamos integrados, em conjunto por meio da União Europeia. Queremos melhorar essa relação, não sei se vai se ratificar o acordo Mercosul-União Europeia que já está sendo feita a negociação. No entanto, há resistências e dificuldades nesta ratificação de ambas as partes. Aqui tem duas economias muito grandes, a brasileira e a argentina, já na Europa também somos 27 países, representados pela Comissão Européia. Assim, a negociação se faz globalmente entre os 27 e os quatro. Nós desejamos a rápida ratificação assim como a Espanha e Portugal. Acredito que vamos resolver isso nos próximos anos. Então, a nossa segunda prioridade é manter essa boa relação política que temos entre os dois países e, a parte, o intercâmbio bilateral.
Diante disso, quero fazer tudo o que estiver ao meu alcance para melhorar as relações bilaterais entre nossos países. Isso será mais concreto com a visita que nosso Ministro das Relações Exteriores, Nikos Dendias, em breve, que é a primeira em toda a história. Será um marco muito importante, dará a direção das relações Brasil Grécia.
Agora nos interessa muito a participação do Brasil no Conselho de Segurança da ONU para este biênio como membro não permanente. Grécia também é candidata para o biênio de 2025/2026, logo após o Brasil. Vamos nos inspirar também na atuação e experiência brasileira, claro com as nossas próprias características, mas estimulados em ver como estará fazendo o Brasil, que tem muita tradição diplomática.
O Brasil é um país latino com projeção mundial, assim como a União Européia, a qual a Grécia faz parte.
Desejamos ainda, o impulsionamento no terreno cultural, de estudantes, pesquisadores, organizar exposições e nisto estou bastante comprometido com meu colega Embaixador brasileiro em Atenas para ampliar as atividades culturais. Ele está começando a traduzir livros de literatura brasileira para o grego e já foram publicados na Grécia. Obras clássicas como Vidas Secas, de Graciliano Ramos; Amar, verbo intransitivo, de Mario de Andrade; A hora da Estrela, de Clarice Lispector e ainda Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, além de vários autores portugueses também.
A cultura grega é muito rica. O senhor pensa em um projeto cultural novo, trabalhar com os consulados no Brasil?
No terreno cultural, além do mencionado, deveríamos fazer mais coisas, traduções de literatura de ambos os lados, exposição, pintura, intercâmbio de estudantes. Aqui temos um protocolo de cooperação entre universidades com brasileiros que vivem na Grécia e gregos que vivem no Brasil. São uma ponte de comunicação entre os dois países. Eu, como embaixador, acho importante a cultura e meu sonho é que uma vez o Teatro Nacional da Grécia, dê uma tragédia clássica e uma turnê em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília com obras de Sófocles e Eurípides.
Culturalmente falando, como história, tradição, tem grandes brainpowers. Você fala da Acrópolis e do Parthenon, em Atenas todos o conhecem, foi lá o berço da democracia, a vontade do povo, a palavra democracia é grega, inventamos não só a palavra mas sua essência. Ela é a concepção, o nosso pilar. Todos os termos da medicina a maior parte das palavras relacionadas às ciências em geral são gregas. Somos reconhecidos em todo o mundo. O que aconteceu é que a Grécia não soube vender isso como produto. Somos pessoas inocentes, e não buscamos vender, temos toda essa cultura, tradição e tudo isso é um patrimônio da humanidade. Somos uma nação que compartilha, não há um lugar no mundo onde não existe a palavra democracia, a palavra síntese. Há uma multidão de palavras que todo o mundo entende, tais como: Síndrome, histeria, Bíblia, fobia, análogo, hipocrisia, paralelo, déspota, ícone, história, filosofia, caráter, entre várias outras. Temos um poder brando.
O Brasil exporta soja, café e recentemente até espumante para a Grécia. Como está o comércio bilateral? Quais os produtos envolvidos na importação e exportação dos dois países?
Nos dois últimos anos importamos soja, minerais e alguns produtos químicos e exportamos para o Brasil parte das nossas palavras e ainda produtos de petróleo refinado. Não somos produtores, mas exportamos óleo elaborado para aviões, medicamentos para o setor farmacêutico e produtos para barbear e também produtos químicos, isto muda com o tempo.
Os brasileiros redescobriram os vinhos gregos. Há expectativa de aumento da exportação para o Brasil?
Na Grécia se produz vinho desde 2.000 anos antes da nossa era. Homero em Ilíada e Odisséia já falam do vinho. Agora também, seguimos sendo produtores de vinho de grande qualidade. Nosso problema é que a Itália, a Espanha e principalmente a França se sobrepõe porque têm uma produção muitíssimo maior. Então os gregos tradicionalmente produziam vinho e os vendia a granel para a França e a Espanha, eles então misturavam com seus vinhos, colocavam em uma garrafa bonita, uma etiqueta e os vendia e é assim que continua ocorrendo. O mesmo acontece com o azeite de oliva. Temos um azeite de qualidade muito boa, mas em comparação com a França e a Espanha que produzem muitas vezes mais que nós, com isso a competição é muito grande. Exportamos para a Alemanha, países europeus, mas aqui na América Latina chega com dificuldade pela distância, pela competição, a resistência dos importadores brasileiros.
Voltando aos vinhos, melhoramos muito nossa forma de vender e produzir. Existem algumas marcas gregas na Macedônia, norte da Grécia. São os vinhos do Mar Egeu, vinhos de Creta, de Kefaloniá, das ilhas e do Peloponeso. Nestes últimos 30 anos, aprendemos a engarrafar e apresentá-los bem, ganhamos muitos concursos, somos agora uma potência média nos vinhos. Podemos competir facilmente com os espanhóis, franceses e italianos, porque nossos químicos e especialistas, estão trabalhando há 40 anos para isso, já mudamos e modernizamos muito a nossa forma de vinificação.
Na Grécia, se produz vinhos inclusive nas montanhas. Nas terras das ilhas do Norte tem condições climáticas que combinados com as substâncias do solo e fica perfeito. Em Santorini se produz vinhos de altíssima qualidade, por exemplo, por causa do solo vulcânico. Temos excelentes vinhos brancos, tintos, já os roses produzimos menos. São uvas especiais, variedades de vinho que só existem na Grécia, são únicos como: Ayorgítico (tinto de Nemea, Peloponeso); Xinômavro (tinto da Macedônia); Debina (branco de Épiro); Malaguziá (branco do Peloponeso); Assýrtico (branco de Santorini e toda a Grécia) e o Mosrato (tinto suave da Ilha de Samos). Os vinhos tintos são encorpados e muito aromáticos, os vinhos brancos são leves, aromáticos e frutoso. Tentaram replantar vinhedos para outros terrenos, mas o resultado não foi o mesmo. Não podemos esquecer que somos quase os inventores do vinho, existia desde a antiguidade, e na Mitologia representado pelo deus Dionísio, o deus do vinho.
Algumas empresas os importam para o Brasil e podem ser encontrado em São Paulo, mas há um grande controle. Aqui não se encontra, por exemplo, o queijo grego feta, que se encontra na Argentina, no Chile, mas aqui não, porque o Brasil é um país muito protecionista, ou seja, todos os produtos importados têm taxas que sobem o preço, perdendo competitividade. Vocês querem vender seus produtos, o vinho, por exemplo, vejo que aqui tem vinhos chilenos, franceses, espanhóis e poderia estar muito bem nas suas prateleiras também os vinhos gregos. Isso exige mais esforço dos importadores.
Conclusão, os vinhos gregos são um capítulo importante das nossas exportações.
O que o senhor poderia falar sobre a posição do governo grego em relação à guerra na Ucrânia?
Em relação ao tema da Ucrânia, nossa posição é similar a do Brasil. Condenamos a invasão russa, mas demos um passo a mais, como membro da União Europeia, somos a favor das sanções e o Brasil não. Condenamos a questão da ocupação. Esta Invasão Russa, parece a Invasão da Turquia a Chipre, há aproximadamente meio século e infelizmente, a Turquia segue ocupando território Cipriota.
Então nossa posição em relação à Rússia é de condenação expressa e severa, em posição das sanções e ajudar o povo ucraniano; fazer todo o possível e encontrar uma solução, se possível, pacífica, a Grécia é sensível a este tema também pela sua preocupação com a comunidade grega que vive em Mariopolis, que são aproximadamente 100 mil pessoas.
Em relação à proteção do meio ambiente, quais têm sido as iniciativas da Grécia para protegê-lo?
Temos o objetivo da descarbonização, seguimos a tendência mundial, somos bons alunos. Temos um limite no tempo que tem a União Européia instituiu para todos os países membros. Às vezes somos demasiadamente ambiciosos, agora com o problema da crise energética decorrente do conflito na Ucrânia, adaptamo-nos aos objetivos da União Europeia. Espero que logo toda a União Europeia alcance os objetivos da descarbonização e de menos uso de energia não renovável. Somos como o Brasil que tem muito sol e vento, bom para a energia solar e eólica. Somos uma potência média nessa área das energias renovaveis, temos nossas empresas que cooperam com alguns países europeus, empresas estas que vão criar parques eólicos no Chile, por exemplo. Esse é outro terreno com possibilidade de cooperação, o da energia renovável, embora essa seja uma área que já estamos muito comprometidos com os trabalhos em outros países. Somos um país com vocação ecológica.