Rodrigo Craveiro
A Comissão Europeia — órgão executivo da União Europeia (UE) — recomendou que os 27 países-membros do bloco facilitem as viagens essenciais para o Reino Unido, bem como o trânsito de passageiros no território britânico, apesar do avanço da nova cepa do coronavírus. “Antes as atuais incertezas e à luz do princípio da precaução, os Estados-membros deveriam tomar medidas coordenadas para desencorajar viagens não essenciais entre o Reino Unido e a UE. Ao mesmo tempo, a proibição de viagens não deveria impedir milhares de cidadãos britânicos e da UE de retornarem para suas casas”, afirmou Didier Reynders, comissário para a Justiça. A comissária para Transporte, Adina Valean, considerou que é preciso “manter intacta a cadeia de suprimentos”.
A França atendeu ao apelo e anunciou que vai autorizar, a partir de hoje, o regresso do Reino Unido de pessoas que residam na França ou no espaço europeu, ou sempre que “necessitarem fazer deslocamentos essenciais”. A condição é que elas apresentem teste negativo para a covid-19 feito com menos de 72 horas. A medida vale para os motoristas de 2.800 caminhões retidos na rodovia que liga Londres a Dover, o principal porto britânico do Canal da Mancha, e em um antigo aeroporto da região do sul da Inglaterra.
“Aviões, navios e (trens de alta velocidade) Eurostars retomarão os seus serviços amanhã (hoje). Cidadãos franceses, residentes na França e aqueles que tenham uma razão legítima (para viagem) deverão apresentar o teste negativo”, declarou o ministro dos Transportes da França, Jean-Baptiste Djebbari. O homólogo britânico, Grant Shapps, confirmou que Londres e Paris chegaram a um acordo sobre as fronteiras e pediu que os caminhoneiros não se dirijam à Cantuária, nos arredores de Dover. Várias nações da Europa e de outros continentes interromperam as viagens aéreas, ferroviárias ou marítimas com o Reino Unido.
A Alemanha prolongou até 6 de janeiro o fechamento das fronteiras a pessoas procedentes do Reino Unido. Ontem, autoridades sanitárias de Bruxelas anunciaram que quatro casos de infecção pela nova variante do Sars-CoV-2 foram detectados na Bélgica no começo de dezembro. “É pouco, mas não é impossível que haja mais”, disse à agência France-Presse o infectologista Yves Van Laethem, porta-voz do combate à pandemia na Bélgica. “Como muitos países, não rastreamos tantas cepas quanto os ingleses, que fazem um trabalho enorme nesse nível.”
Geneticista – Em entrevista ao Correio, o geneticista britânico Jeffrey Barrett — diretor da Iniciativa Covid Gemonics do Instituto Wellcome Sanger (uma força-tarefa para decifrar o genoma do Sars-CoV-2), em Hinxton (Reino Unido) — afirmou que há três razões para se preocupar em relação à nova cepa. “Em primeiro lugar, ela tem se espalhado muito rapidamente, no momento em que já há um grande número de casos no Reino Unido. As análises estatísticas sugerem que a nova variante se espalha mais rapidamente do que as anteriores. Em segundo lugar, nós detectamos 23 novas mutações nesta cepa, o que é bastante incomum. Todos os vírus, inclusive o Sars-CoV-2, se modificam, mas ver tantas mutações surgirem em um mesmo período é muito raro”, relatou. “Em terceiro lugar, algumas dessas mutações afetam a biologia do próprio coronavírus.” Até que as vacinas sejam distribuídas em todo o mundo, o estudioso recomenda que todas as medidas de prevenção sejam reforçadas e seguidas à risca.
Especialista em saúde global da Faculdade de Medicina da Universidade de Southampton, o britânico Michael Head considera “totalmente razoável” a resposta de parte da comunidade internacional ao surgimento da nova cepa no Reino Unido. “Quando países registram alta carga da doença e ante o desenvolvimento de variante viral, eles têm de implementar medidas, como quarentenas ou proibição de viagens, com exceção daquelas consideradas sociais. Isso é o que vamos agora”, explicou à reportagem. “Os voos internacionais são o que causou a propagação do coronavírus ao redor do mundo tão rapidamente. Portanto, as restrições ao movimento populacional serão úteis para suprimir a transmissão contínua através das fronteiras internacionais.”
Portas abertas sobre o Brexit – O negociador europeu para o Brexit, Michel Barnier, afirmou que a União Europeia (UE) está disposta a negociar “até o fim do ano e além, se for necessário”, um acordo pós-Brexit com o Reino Unido, a menos de dez dias da ruptura definitiva. Segundo várias fontes europeias, o negociador também reconheceu, durante um encontro com os embaixadores dos Estados-membros da UE, que rejeitou uma oferta recente de Londres sobre a pesca. Este tema continua sendo o principal ponto de bloqueio entre as partes.