Renata Vargas Amaral (*)
Discutir sobre Trump e as perspectivas para o mundo durante a sua gestão que, até o momento, tem sido bombástica, tornou-se um dos principais afazeres de economistas, cientistas políticos, acadêmicos e jornalistas ao redor do mundo.
Historicamente, sempre houve uma íntima ligação entre uma economia ser uma super potência econômica e ser, ao mesmo tempo, a principal porta voz para o livre comércio. Esse tem sido o papel dos Estados Unidos notadamente após 1945, com o final da Segunda Guerra Mundial. Ocorre que, desde que Trump assumiu a presidência da principal economia do mundo ele tem recrudescido o seu discurso protecionista: “America First”.
Como fica o mundo e como fica o Brasil?
Para aqueles que estão acompanhando atentamente os movimentos do novo chefe de Estado americano nos mais diversos temas sobre os quais ele já se pronunciou, uma coisa é certa: Trump é imprevisível. E isso pode contar a seu favor. Com efeito, ao adotar essa postura ameaçadora e o efeito surpresa das suas decisões, Trump faz uso de uma técnica de negociação que pode, em grande medida, resultar em sucessos imediatos na implementação das políticas que o elegeram presidente. Mas, há quem diga (e eu concordo) que o presidente não se sustentará por muito tempo no cargo se não calibrar o seu discurso e suas ações nos próximos meses.
No que diz respeito ao comércio internacional, a postura protecionista é a principal chamada da política econômica pregada por Donald Trump, que já ficou conhecida como “Trumponomics”. De forma resumida, a política econômica do presidente americano está baseada em três grandes pilares: sanções comerciais para parceiros desleais; expansão fiscal para financiar obras de infraestrutura e; desoneração tributária. Boa parte dos analistas concordam que a política econômica proposta (que resgata, em grande medida, a política econômica de Reagan na década de 80) pode gerar benefícios aparentes e imediatos para a economia americana, mas que é insustentável no médio/longo prazos.
O que se tem certeza também sobre comércio internacional é que Trump tentará isolar a China e o México. No entanto, essa estratégia poderá ter um efeito reverso enorme para a economia americana. Não custa lembrar que os EUA são o país com mais empresas transnacionais do mundo, que a China é a maior credora de títulos da dívida pública dos EUA, e que boa parte das plantas industriais das empresas americanas estão localizadas no México.
Para o Brasil, se o Brasil souber aproveitar e as empresas estiverem prontas para isso, preveem-se benefícios como oportunidade para o incremento das exportações de commodities minerais (em razão da política de expansão fiscal para obras de infraestrutura), bem como intensificação da relação do Brasil com o México e demais países com os quais o EUA poderá passar a comercializar menos (lembro da saída dos EUA da TPP, na possível denúncia ao NAFTA e na não continuidade da parceiria com a União Europeia, o TTIP).
Ademais, para o Brasil, prevê-se a continuidade das iniciativas em facilitação de comércio e redução de barreiras não-tarifárias, e das dezenas de diálogos comerciais que o Brasil mantém com os EUA em diversos setores da economia. Vale lembrar, ainda, que o Brasil mantém uma balança comercial deficitária com os EUA, motivo pelo qual o país não está no foco direto das iniciativas protecionistas de Trump.
Os empresários brasileiros devem estar atentos às oportunidades que podem aparecer para o comércio bilateral em função do enfraquecimento dos grandes acordos de comércio dos quais os EUA faz parte ou estava negociando.
Nesse sentido, por não ser o Brasil um dos focos de Trump no que diz respeito ao comércio internacional, se o novo presidente lograr em dar seguimento às suas políticas protecionistas em relação a outras economias que ele entende como ameaças ao seu mercado doméstico, podem resultar daí oportunidades para o empresariado brasileiro. Positivamente para o Brasil, some-se ainda o fato de a pauta de exportações brasileiras para os EUA ser composta de produtos de alto valor agregado (produtos industrializados) onde há espaço para exportar mais.
Então, pensando-se apenas na relação bilateral de comércio Brasil-EUA, e nas oportunidades que podem advir do recuo dos EUA como grande protagonista de megaacordos comerciais, há que se explorar o comércio bilateral, mapear novas oportunidades de acesso a mercados e fazer um esforço conjunto para ocupar o espaço que está se abrindo. Resta saber se o Brasil (governo e setor privado) está pronto para competir e se reposicionar no jogo do comércio internacional.
(*) Diretora de Comércio Internacional da Barral MJorge. É Doutora em Direito do Comércio Internacional por Maastricht University (PhD, Holanda) e pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Fellow do Institute for Globalization and International Regulation (Maastricht University) desde 2010 e Visiting Scholar da Fundação Getúlio Vargas (FGV) desde 2013. É autora de um livro e vários artigos acadêmicos na área de comércio internacional publicados no Brasil e no exterior.