República Dominicana conseguiu excluir de recuperação judicial crédito decorrente de acordo de leniência com a Odebrecht. Ao decidir, o juiz de Direito João de Oliveira Rodrigues Filho, da 1ª vara de Falências e Recuperações Judiciais, entendeu que a imunidade de jurisdição teria efeito no caso, porque o acordo de leniência resultou de ato de império.
A República Dominicana requereu a exclusão de crédito detido em favor da Procuradoria General de la República Dominicana no montante de US$ 124 milhões em face da Odebrecht.Alegou estar sujeita à regra de imunidade de jurisdição, de modo a não ser possível a imposição da autoridade judiciária brasileira para o ato de soberania estatal consistente no acordo de leniência celebrado em seu território soberano, devendo ser reconhecida a incompetência do juízo para deliberar sobre o crédito.
No mérito, sustentou haver um tratamento desigual entre créditos da mesma natureza, uma vez que o acordo de leniência celebrado pela Odebrecht S.A. com a CGU e a AGU foram excluídos da relação de credores da própria recuperanda, enquanto o seu crédito foi incluído, sem qualquer justificativa para abordagem distinta de situações iguais, o que poderia ferira regra da par conditio creditorum.
A Odebrecht, por sua vez, alegou que a lei 11.101/05 é aplicável ao crédito em questão, uma vez que ele não seria cobrado mediante execução fiscal, caso houvesse intenção de sua exação no Brasil. Assim, não haveria qualquer exceção legal na qual o crédito pudesse se subsumir, para legitimar sua exclusão ao processo recuperacional, razão pela qual ele deve ser mantido e inscrito no QGC.
O Ministério Público apresentou sua manifestação sobre o caso. Entendeu não haver espaço para discussão sobre a imunidade de jurisdição, uma vez que o debate gira em torno de acordo de leniência efetuado no território do impugnante segundo sua legislação, aplicando-se o art. 9º da LINDB, tanto para obrigações contratuais, como para as obrigações extracontratuais.
Imunidade de jurisdição – Ao analisar o caso, o magistrado entendeu pela necessidade de reconhecimento da imunidade de jurisdição e de execução do impugnante. Para ele, é inegável que o acordo de leniência celebrado na República Dominicana decorreu de ato de império.
“A imunidade de jurisdição tem efeito no caso dos autos, porque o acordo de leniência resultou de ato de império tal como já exposto. O caráter de ordem pública de tal acordo entre as partes, considerando já a legislação apresentada pelo impugnante, tem por fim garantir a eficiência na administração da coisa pública, como forma de coibir práticas deletérias não só sob o ponto de vista patrimonial estatal, mas, da eticidade e impessoalidade que devam reger as contratações do poder público, em prol das melhores condições aos administrados.”
Para o juiz, não se pode negar que a inserção de tal crédito na recuperação judicial também encontra óbice na imunidade de execução, uma vez que o plano imporia perda patrimonial ao acordo efetuado, diante das condições de pagamento diferentes da originalmente prevista quando realizado o ato de império da impugnante.Diante disso, determinou a exclusão do crédito decorrente do acordo de leniência do processo recuperacional.
O escritório Barral Parente Pinheiro Advogados representa a República Dominicana.
Processo: 1092267-04.2019.8.26.0100
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