O principal partido político no Parlamento da Tunísia propôs, nesta terça-feira (27), a realização de eleições antecipadas após as ações contundentes do presidente Kais Saied, que suspendeu a Assembleia e destituiu o primeiro-ministro Hichem Mechichi, gerando preocupação na comunidade internacional.
Em dois dias, o presidente tunisiano suspendeu a atividade parlamentar por um mês, destituiu o chefe de governo Hichem Mechichi e dois ministros e deu a si mesmo o poder Executivo deste país norte-africano, afetado por uma crise econômica e social acentuada pela pandemia. Esses movimentos geraram preocupação na comunidade internacional, especialmente nos Estados Unidos, França e na União Europeia.
“Pedimos o restabelecimento institucional o mais rápido possível e, principalmente, a retomada da atividade parlamentar, o respeito dos direitos fundamentais e a abstenção de qualquer forma de violência” na Tunísia, disse nesta terça-feira o chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, em um comunicado.O ministério das Relações Exteriores russo também apontou que “as divergências internas devem ser resolvidas apenas no marco do direito”.
Indignação e desemprego – Depois de denunciar “um golpe de Estado contra a revolução e a Constituição”, o partido do primeiro-ministro Hichem Mechichi, Ennahdha, se mostrou disposto nesta terça-feira “a realizar eleições legislativas e presidenciais antecipadas simultaneamente”.
Segundo este partido de inspiração islamita, principal força parlamentar, isso serviria para “garantir a proteção do processo democrático e evitar que qualquer atraso sirva de pretexto para manter um regime autocrático”.
As contundentes medidas do presidente Saied contam com o apoio de vários tunisianos, indignados com o governo pela sua gestão da pandemia de covid-19 ao ser um dos países com a maior taxa de mortalidade do mundo.
Outros temem um retorno à ditadura nesta jovem democracia surgida após a revolução que derrubou Zine el Abidine Ben Ali em janeiro de 2011, geralmente apresentada como a única bem-sucedida da Primavera Árabe.
Os problemas endêmicos do desemprego e a degradação das infraestruturas públicas que estavam na origem dessa revolta não foram resolvidos.
O órgão que governa o Parlamento tunisiano, presidido por Rached Ghannouchi, também do Ennahdha, “expressou com unanimidade sua rejeição absoluta e sua firme condenação ao que foi anunciado pelo chefe de Estado Kais Saied” em um comunicado na madrugada de segunda para terça-feira.
“Temer pela revolução?”
“O pontapé dado por Kais Saied no centro parlamentar pegou muitas pessoas desprevenidas, começando por Ennahdha”, diz o jornal Le Quotidien. “Devemos temer pela revolução?”, questionou o jornal La Presse em um editorial no qual destaca que “o espectro da incerteza política e a falência, conjugado aos efeitos de uma crise sanitária mal administrada, provocaram um terremoto no domingo”.
Na segunda-feira, o primeiro-ministro tunisiano Hichem Mechichi se mostrou disposto a ceder o poder a um futuro primeiro-ministro designado por Saied. “Garantirei a transferência de poder para a pessoa que for designada pelo presidente”, declarou.
O que ocorreu na Tunísia provocou muitas reações de outros países. A França desejou um “retorno, no melhor dos prazos, a um funcionamento normal das instituições”, enquanto os Estados Unidos disseram estar “preocupados” e pediram “respeito aos princípios democráticos”. “O presidente Saied está diante de um grande desafio para mostrar aos tunisianos e ao mundo que tomou boas decisões”, disse à AFP o cientista político Slaheddine Jourchi.