As manifestações decorrem no país na véspera do Dia Internacional da Mulher. Em outubro, o Tribunal Constitucional, controlado de facto pelo Governo ultraconservador do partido Lei e Justiça (PiS), pronunciou-se a favor de uma medida que praticamente impossibilita o aborto legal na Polónia, ao não permitir este tipo de intervenção no caso de malformação grave do feto.
Isso provocou uma onda de protestos considerada como a maior mobilização social desde 1989. As manifestações, com apoio social maioritário, espalharam-se por todas as grandes cidades e também por algumas menores, numa situação inédita. Quase seis meses depois, ainda podem ser vistos faixas e cartazes de apoio com um raio negro e a frase “Inferno das mulheres”.
O Governo polaco classifica estes protestos como “extremistas” e acusa quem os promove de motivações políticas e não de lutar pelos direitos civis. A repressão policial, incluindo o ataque a um deputado e vários jornalistas, tem sido criticada dentro e fora do país. O apoio aos protestos tem sido crescente, mobilizando cada vez mais estudantes, críticos da Igreja e grupos de minorias sexuais.
A legislação polaca sobre o aborto é uma das mais restritivas do mundo. Antes de 1989, cerca de 500.000 abortos eram realizados na Polónia por ano e agora, de acordo com o Governo, são menos de 1.000. No entanto, mais de 95% dessas intervenções são ilegais sob a nova legislação, porque o aborto só é permitido legalmente quando há perigo de morte para a mãe ou violação.
A cada ano, cerca de 150.000 polacas interrompem a gravidez ilegalmente, colocando a sua saúde em risco. A educação sexual não é oferecida atualmente nas escolas polacas. A Comissária Europeia para a Igualdade, Helena Dalli, afirmou que “a restrição substancial ao acesso legal ao aborto vai contra as obrigações internacionais da Polónia de respeitar os Direitos Humanos”.
O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ned Price, disse recentemente que Washington está “a observar de perto a situação” de Marta Lempart, a líder dos protestos que está detida.
Se a Polónia, como ameaçou, sair da Convenção de Istambul, um acordo multilateral sobre os direitos das mulheres e contra os abusos sexistas, será o único país da União Europeia ausente. Os protestos não servem apenas como plataforma para as reivindicações feministas, mas também revelaram o repúdio de grande parte da população a outras políticas de Governo.
Os grupos responsáveis pelas manifestações garantiram que, a partir deste mês, vão redobrar os protestos, apesar das restrições à circulação e reuniões públicas impostas pelo Governo devido ao coronavírus da covid-19.