Cristovam Buarque
A democracia tem que aceitar a alternância de poder e, por consequência, de políticas e prioridades. Na democracia, a cada período, um novo governo pode reorientar os rumos da economia e da sociedade, até que outra alternância permita novas mudanças, depois de nova eleição. Essas orientações diferentes podem ser realizadas sem grandes dificuldades: salvo no caso de política externa.
Cada aliança internacional exige esforço de anos, décadas; cada reorientação rápida exige outro longo período para recuperar o que foi perdido.
A relação do Brasil com Israel tem sete décadas, desde a criação deste país nas Nações Unidas. A boa relação com os países árabes também tem décadas de um sistemático trabalho através de diferentes governos, com partidos diferentes. Uma reorientação desse equilíbrio, optando por um dos lados, deixará marcas negativas que exigirão décadas para serem sanadas. O mesmo valeria para outras decisões de política externa com as relações com China ou com países Europeus.
Mais do que as decisões de política interna, as decisões externas exigem cuidado. Para isso, os gestores das relações internacionais brasileiras deveriam usar o enorme potencial das representações que há em Brasília. Ouvir os embaixadores e seus auxiliares deveria ser uma tarefa diária dos membros do MRE. Sendo reitor da UnB, utilizei com frequência a convivência com as embaixadas e seus funcionários. Quando fui professor do Instituto Rio Branco, sempre procurei ouvir esses representantes cada vez que tinha uma dúvida. Como governador do DF, mantive relação constante e como senador sempre tentei ser uma espécie de embaixador dos embaixadores.
Sugiro aos que hoje fazem a política externa brasileira que aproveitem esse imenso potencial brasiliense, para nos orientar e que, para além disso, permita enriquecimento cultural.
Cristovam Buarque é professor emérito da UnB. Foi ministro da Educação, governador do Distrito Federal e senador da república por 16 anos.