Em retorno, o grande aiatolá xiita Ali Sistani declarou a ele, neste sábado (6), seu compromisso com a “paz” e a “segurança” dos cristãos no Iraque. Depois deste encontro na cidade sagrada xiita de Najaf, o papa deu início ao ponto alto espiritual de sua jornada: a peregrinação a Ur, cidade natal de Abraão no sul do Iraque, para rezar por “liberdade” e “unidade”, a fim de pôr fim às guerras e ao “terrorismo”. Era esta cidade, na planície desértica onde nasceu o pai dos monoteísmos, que João Paulo II quis visitar em 2000, antes de ser impedido por Saddam Hussein.
Francisco, conhecido por suas mãos estendidas em todas as direções para outras religiões, acrescentou seu toque: insistiu em rezar com dignitários yazidis – uma pequena minoria do Iraque martirizada pelos extremistas do grupo Estado Islâmico (EI) – mas também sabeus e zoroastristas – comunidades milenares no país – e muçulmanos – xiitas e sunitas.
– “Paz” para os cristãos do Iraque -Antes disso, o líder de 1,3 bilhão de católicos do mundo conversou por quase uma hora com o grande aiatolá Ali Sistani, referência religiosa para a maioria dos 200 milhões de xiitas no Iraque e em outros lugares. Ao final desta reunião a portas fechadas, um dos encontros religiosos mais importantes da história, o grande aiatolá Sistani disse ao papa que estava comprometido a garantir “paz”, “segurança” e “todos os direitos constitucionais” aos cristãos do Iraque.
O papa os encontrou, enfim, na parte da noite. Na Igreja de São José, no centro de Bagdá, ele celebrou sua primeira missa em público, de longe o exercício que ele prefere. Diante de uma esparsa assembleia devida ao coronavírus, o soberano pontífice de 84 anos pronunciou sua primeira missa de rito oriental, iniciada sob ululações e traduzida para o árabe e o aramaico. O encontro entre Francisco e o grande aiatolá é um acontecimento para o país, e o primeiro-ministro Moustafa al-Kazimi declarou 6 de março o “Dia Nacional da Tolerância e Coexistência”.
A comunidade cristã do país, uma das mais antigas do mundo, encolheu nos últimos 20 anos. Ela passou de 1,5 milhão de membros para cerca de 400.000, em decorrência da violência e da pobreza, endêmica no país. Os cristãos queixam-se regularmente de não serem apoiados pelo Estado perante milicianos ou políticos que tomam as suas casas ou terras e afirmam ter menos acesso ao emprego do que outros. Além do caso dos cristãos, no segundo dia de sua viagem ao Iraque, a primeira da história para um papa, Francisco falou longamente sobre as guerras, que continuam a dilacerar todo o país por 40 anos – e o Oriente Médio.
– O “terrorismo trai a religião” -“Hostilidade, extremismo e violência (…) são traições da religião. E nós, crentes, não podemos ficar calados quando o terrorismo abusa da religião”, disse ele, enquanto em 2014 o grupo Estado Islâmico (EI) tomou um terço do Iraque. As piores atrocidades foram cometidas contra os yazidis, lembrou Francisco na sexta-feira. Os islamitas mataram milhares de homens yazidis, recrutaram crianças à força e escravizaram sexualmente milhares de mulheres.
Para a ONU, tais crimes podem constituir “genocídio”. Além disso, mais de 6.400 yazidis foram sequestrados pelo EI, metade dos quais ainda estão desaparecidos. Em Ur, o papa disse ter rezado “para que eles possam voltar para casa rapidamente”. O EI também causou estragos na vizinha Síria, algo que o papa mencionou repetidamente em seus discursos desde sexta-feira. – “Síria martirizada” -Devemos “caminhar do conflito à unidade” em “todo o Oriente Médio” e “em particular na martirizada Síria”, pediu novamente neste sábado.
– “Síria martirizada” -Devemos “caminhar do conflito à unidade” em “todo o Oriente Médio” e “em particular na martirizada Síria”, pediu novamente neste sábado. No dia anterior, durante um discurso às autoridades em Bagdá, o papa já havia mencionado a Síria, onde uma revolta popular degenerou em guerra há 10 anos. Apesar dos mais de 387.000 mortos, as negociações conduzidas sob mediação da ONU até agora não levaram a nenhum progresso na resolução do conflito.
E, como já havia feito no Marrocos, outro país muçulmano para onde insistiu em ir, o papa, de 84 anos, pediu “liberdade de consciência e liberdade religiosa”. Elas devem ser “respeitadas e reconhecidas em todos os lugares”, porque são “direitos fundamentais”, afirmou. A liberdade de consciência consiste em poder crer ou não crer, mas também em ter o direito de se converter livremente. A liberdade religiosa, um termo mais geral, inclui em particular a liberdade de exercer o culto sem impedimentos.
O papa continuará sua jornada – sob alta proteção e em total confinamento devido à pandemia de coronavírus – com uma missa em uma igreja em Bagdá, seu primeiro encontro com os fiéis católicos do Iraque e de longe o que ele prefere. No bairro central de Karrada, onde está localizada a Igreja de São José, blocos de concreto já estão bloqueando as ruas e forças especiais estão posicionadas.