O anúncio foi feito pela junta militar no poder no Mali, neste domingo (04). O corte de relações com a Ucrânia foi considerado apoio à tese russa sobre o “carácter neonazi” das autoridades ucranianas pelo seu alegado apoio a grupos secessionistas no país africano.
Os militares malianos citam declarações feitas pelo porta-voz dos serviços secretos ucranianos (GUR), Andriy Yusov, após a recente batalha em Tinzaouatene, uma cidade no norte do Mali, que resultou na derrota do exército maliano e dos mercenários do grupo russo Wagner, com dezenas de mortos. Mali acusa um alto funcionário ucraniano de ter admitido o papel de Kiev na pesada derrota que as tropas malianas sofreram em combates em julho.
Nestas declarações a uma estação de televisão local, Yusov sugeriu a colaboração dos serviços secretos ucranianos com grupos secessionistas malianos, que estão em guerra aberta com o Governo central há meses. Segundo o porta-voz do governo maliano, o coronel Abdoulaye Maiga, a junta militar no poder ficou chocada com os comentários de Yusov, que “admitiu o envolvimento da Ucrânia num ataque cobarde, traiçoeiro e bárbaro perpetrado por grupos terroristas armados” que causou a morte de soldados malianos.
Na nota, o governo maliano condena também o facto de o embaixador ucraniano no Senegal, Yurii Pyvovarov, ter publicado a entrevista na página da embaixada na rede social Facebook, motivo para ter sido intimado este sábado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros senegalês.
“Estas declarações extremamente graves, que não foram desmentidas nem condenadas pelas autoridades ucranianas, demonstram o apoio oficial e claro do Governo ucraniano ao terrorismo em África, no Sahel e, mais precisamente, no Mali”, salientam os militares malianos no comunicado.
De acordo com alguns canais russos não oficiais do Telegram, cerca de 80 russos foram mortos, o que seria, de longe, a pior perda para os paramilitares russos em vários anos de operação em África, já que o Kremlin tem procurado usar as forças de procuração para desafiar a influência ocidental no Sahel e na África central e sustentar regimes instáveis.
Segundo a nota, estes acontecimentos “violam a soberania do Mali, ultrapassam o quadro da ingerência estrangeira, já de si condenável, e constituem uma agressão contra o Mali”.
As autoridades malianas declaram ainda que “subscrevem o diagnóstico estabelecido pela Federação Russa, que há anos alerta o mundo para o carácter neonazi e vil das autoridades ucranianas”. Por esta razão é que o corte das relações bilaterais foi “com efeito imediato” das e o envio “às autoridades judiciais” das ações do chefe dos serviços secretos ucranianos e do embaixador como constituindo, na sua opinião, “atos de terrorismo”.
A batalha de Tinzaouatene, registada entre 25 e 27 de julho, resultou na derrota de uma unidade de militares e mercenários do grupo Wagner, que se confrontaram com os secessionistas tuaregues e com extremistas islâmicos aliados da Al-Qaida. Wagner reconheceu a derrota e as baixas entre as suas fileiras, enquanto a Al-Qaida referiu a morte de 50 mercenários e 10 militares malianos, e os secessionistas calculam em 84 o número de mortos entre os membros russos do grupo.
Após a derrota, o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergey Lavrov, garantiu ao seu homólogo maliano, Abdoulaye Diop, que a Rússia ajudará o Mali a reforçar o seu exército.
O ataque em causa foi reivindicado por um grupo rebelde tuaregue juntamente com a JNIM (Jama’at Nusrat al-Islam wal-Muslimin), afiliada da Al Qaeda no Sahel. Conhecidos pela cooperação ad hoc, ambos parecem ter colaborado para capturar o comboio russo.
Após o ataque, o JNIM alegou que uma “emboscada complexa” tinha destruído o comboio, matando 50 russos e vários soldados malianos, tendo publicado vídeos que mostram vários veículos em chamas, como dezenas de corpos na área. Um porta-voz do grupo militante tuaregue disse que algumas tropas malianas e combatentes russos também foram capturados durante a batalha.