SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo Joe Biden espera que o presidente Jair Bolsonaro demonstre “seriedade” na discussão sobre desmatamento durante a Cúpula de Líderes sobre o Clima e descarta, neste momento, focar em recursos financeiros em troca de promessas de preservação ambiental, como reivindica o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
“Nós realmente esperamos que o presidente Bolsonaro use essa oportunidade [cúpula do clima] para demonstrar a seriedade dele, abordando a mudança climática e a redução de emissões causadas pelo desmatamento na Amazônia”, disse à reportagem um porta-voz do Departamento de Estado dos EUA.
Questionado se os Estados Unidos fechariam um acordo com o Brasil oferecendo recursos financeiros em troca da preservação da Amazônia, o porta-voz respondeu: “Continuamos focando nossas conversas nas medidas necessárias para frear o desmatamento ilegal, em vez de pensar em fontes específicas de financiamento”.
A resposta é uma ducha de água fria nas pretensões de Salles, que vem tentando convencer os EUA a enviarem dinheiro ao Brasil em troca de metas de redução de desmatamento. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Salles declarou que conseguiria reduzir a devastação da Amazônia em até 40% em 12 meses –mas somente se recebesse US$ 1 bilhão de países estrangeiros.
Em reunião com integrantes da equipe de John Kerry, enviado especial para o clima do governo Biden, Salles mostrou slides com a imagem de um cachorro sentado, abanando o rabo diante de uma máquina de frango assado. Segundo reportagem do jornal Folha de S.Paulo, o desenho vinha acompanhado do texto “expectativa de pagamento”, e os frangos carregavam cifrões de dólares estampados no peito.
O governo americano espera que Bolsonaro, em seu discurso na cúpula da semana que vem, assuma “um compromisso muito claro de acabar com o desmatamento ilegal, com medidas tangíveis para punir os desmatadores e uma sinalização política de que desmatamento ilegal e invasões de terra [grilagem] não serão tolerados”, informou o porta-voz do Departamento de Estado. “Acreditamos que é realista esperar que o Brasil tenha uma redução real no desmatamento até o fim da estação de queimadas de 2021.”
A gestão Biden vem sofrendo pressões de organizações internacionais de meio ambiente e de direitos humanos para não fechar um acordo que repasse recursos ao governo Bolsonaro. Em reunião recente com membros da equipe de Kerry, organizações enfatizaram que o presidente não é confiável e que repassar recursos antes de haver progresso real seria premiar o retrocesso na política ambiental brasileira e ajudar na estratégia de relações públicas de Bolsonaro.
Nesta quinta-feira (15), ativistas e legisladores promovem um evento paralelo à cúpula dos líderes, o Amazon Climate Forum, com participação de Sonia Guajajara, porta-voz da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), da deputada federal Joenia Wapichana, de Daniel Wilkinson, diretor da área de meio ambiente e direitos humanos da Human Rights Watch, de deputados da ala mais progressista do Partido Democrata, como Raul Grijalva e Mark Pocan, e de artistas como Morgan Freeman e Barbra Streisand.
Os atores Leonardo Di Caprio e Mark Ruffalo também se juntaram à ofensiva contra um acordo que premie Bolsonaro. “Joe Biden, suas opções são ou a Amazônia ou Bolsonaro. Escute os povos originais [indígenas] e tome a decisão correta para o povo do Brasil e para nossa Terra”, escreveu Ruffalo no Twitter.
Embaixadores de outros países, além dos EUA, indicaram, em videoconferência com o chanceler brasileiro, Carlos França, na sexta-feira (10), que o apoio financeiro só será liberado após serem mostrados resultados. Também segundo reportagem da Folha de S.Paulo, essa foi a mensagem dos chefes das missões diplomáticas em Brasília de Alemanha, Reino Unido, Noruega, EUA e União Europeia.
“Reconhecemos e respeitamos a soberania do Brasil ao lidar com desafios ambientais, e podemos reforçar nosso forte histórico de cooperação ambiental para atingir objetivos mais ambiciosos”, disse o porta-voz do Departamento de Estado americano.
“A Cúpula dos Líderes é uma oportunidade para o Brasil demonstrar liderança ambiental no cenário global. E esperamos que as declarações feitas pelos líderes sejam embasadas em ações tangíveis em seus países.”