A Amnistia Internacional (AI) classificou esta terça-feira de “desumana e devastadora” a decisão do Governo da Malásia de deportar 1086 migrantes para Myanmar (antiga Birmânia) desafiando uma ordem do Supremo Tribunal.
Kuala Lumpur anunciou hoje ter deportado os migrantes poucas horas depois de aquele tribunal ter ordenado a suspensão por um dia da deportação de 1200 migrantes de Myanmar em resposta a um pedido das secções malaias das organizações Amnistia Internacional e Acesso ao Asilo.
“Acreditávamos que, com uma ordem judicial, aqueles que deveriam ser deportados estariam seguros, e por isso estamos chocados que o governo tenha continuado com a deportação”, disse a diretora-executiva da secção malaia da AI, Katrina Jorene Maliamauv, num comunicado.
A responsável da AI lamenta que as autoridades da Malásia tenham “forçado essa deportação chocantemente cruel antes de qualquer escrutínio apropriado da decisão” e critica como “manifestamente falsas” alegações das autoridades malaias “de que não havia requerentes de asilo no grupo”.
Maliamauv considera ainda “terrível que não tenha sido permitido que o ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados) tivesse acesso ao grupo – tal como tem sido negado acesso aos centros de detenção de migrantes desde agosto de 2019”.
O chefe dos serviços malaios de imigração, Khairul Dzaimee Daud, garantiu, em comunicado, que 1086 pessoas tinham concordado em voltar para casa voluntariamente e enfatizou serem todos cidadãos de Myanmar, não havendo no grupo refugiados muçulmanos de etnia rohingya ou requerentes de asilo.
A declaração não mencionou a ordem do tribunal nem explicou porque é que apenas 1086 pessoas foram deportadas em vez das 1200 que estavam em causa. Para a Amnistia, a decisão que “coloca em risco a vida” de muitas pessoas deixa também uma “marca indelével no histórico de direitos humanos da Malásia”.
“A audiência de amanhã (quarta-feira) no tribunal, que se mantém, deve revelar respostas sobre o ocorrido. Um acontecimento como o da deportação de hoje – realizada em sigilo e sem acesso da ONU a pessoas vulneráveis – não deve ser permitido que se repita”, assinala Maliamauv.
No domingo, um grupo de 27 deputados e senadores da Malásia também enviou uma carta ao primeiro-ministro malaio, Muhyiddin Yassin, pedindo-lhe para pôr fim à deportação. Com a Junta Militar de Myanmar no poder, o grupo expressou também “a preocupação” de que os migrantes enfrentem perseguições após serem obrigados a regressar à antiga Birmânia.
A Malásia não reconhece os requerentes de asilo ou refugiados, mas tem permitido que muitos migrantes permaneçam no país por razões humanitárias. O país alberga cerca de 180 mil refugiados e requerentes de asilo, além de mais de 100 mil membros da etnia rohingya e de outras minorias birmanesas.