O Congresso do Peru aprovou nesta sexta-feira, 11, por 65 votos a favor, 36 contra e 24 abstenções, a moção de vacância, abertura de um processo para destituir o presidente Martín Vizcarra por “incapacidade moral”. Se aprovada, será a segunda destituição em 20 anos no Peru. Antes da votação, o governo classificou a ação como um “golpe de Estado”.
Vizcarra, que assumiu o poder em março de 2018 após a renúncia do presidente Pedro Pablo Kuczynski, do qual era vice, aparece em áudios que se tornaram públicos pedindo a seus assessores que mentissem em uma investigação parlamentar sobre um contrato polêmico com um cantor. Ao apoiar a moção no plenário, o deputado oposicionista José Vega disse que os áudios “corroboram” as supostas irregularidades que o Congresso apura há meses.
“Peço ao Congresso que analise a situação com cautela, com responsabilidade e tome a decisão que julgar apropriada”, disse Vizcarra ao visitar o laboratório encarregado de testar uma potencial vacina chinesa contra o covid-19 com 6 mil voluntários peruanos, antes do resultado do Parlamento. Ele disse ainda que não renunciaria e recebeu o apoio do ex-presidente Ollanta Humana (2011-2016), que afirmou que Vizcarra deve continuar até completar seu mandato, em 28 de julho de 2021.
“Esta é uma crise institucional provocada por círculos próximos ao presidente e perigosamente utilizada pelo Congresso. Não cabe vacância, Vizcarra deve continuar, cuidar da saúde, reativar a economia e garantir eleições limpas”, tuitou Humala.
O caso estourou em maio, quando a imprensa descobriu que em plena pandemia o Ministério da Cultura havia contratado o cantor Richard Cisneros, conhecido como Richard Swing, como palestrante e apresentador. Cisneros se gabava na mídia de ter sido conselheiro do governo de Vizcarra. O Parlamento abriu uma investigação sobre os supostos contratos irregulares pelos quais Cisneros teria recebido US$ 10 mil.
Mentiras – Em três áudios divulgados no Congresso peruano na quinta-feira, 10, Vizcarra pede às assessoras Miriam Morales e Karem Roca que mintam sobre a quantidade de vezes que Cisneros foi ao palácio do governo. “É preciso dizer que ele entrou duas vezes”, pede Vizcarra. “O que fica claro é que nessa investigação todos estamos envolvidos”, acrescenta o presidente.
As gravações de Vizcarra foram entregues pelo deputado Edgar Alarcón, presidente da comissão que investiga o caso do ex-assessor do presidente. Não vou renunciar, não vou correr”, disse o presidente na quinta-feira à noite na TV, negando quaisquer atos ilegais. “Estamos diante de uma conspiração contra a democracia”, disse Vizcarra, que conquistou apoio popular por sua cruzada contra a corrupção.
Mas, logo depois, seis dos nove partidos com representação no Congresso anunciaram a apresentação da moção para declarar a “vacância” da presidência. A crise deve afetar ainda mais o Peru, um dos países mais atingidos pela pandemia de covid-19 no mundo, com mais de 700 mil infecções e 30 mil mortes.
A moção lembra duas iniciativas semelhantes movidas contra Pedro Pablo Kuczynski em dezembro de 2017 e março de 2018, o que levou à renúncia do ex-banqueiro. Ela requer 52 votos para ser admitida para debate e para iniciar o processo formal de impeachment e votação em quatro dias. O Congresso precisa de 87 votos para destituir Vizcarra, que não tem partido, nem bancada.Em caso de destituição, o presidente do Congresso, Manuel Merino, assumirá o poder até o restante do mandato, que termina a 28 de julho de 2021.
Golpe – O primeiro-ministro peruano, Walter Martos, denunciou ontem que um “golpe” parlamentar estava em andamento. “O que o Congresso está fazendo no momento é dar um golpe de Estado, pois está fazendo uma interpretação arbitrária da Constituição”, disse Martos, general aposentado do Exército, à rádio RPP.
O vazamento dos áudios se dá no âmbito de constantes embates entre o Congresso e o Executivo. Em setembro de 2019, o presidente dissolveu o Parlamento constitucionalmente e convocou novas eleições legislativas para superar outra crise. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.