Ao alemão Heiko Maas e ao francês Jean-Yves Le Drian, Blinken chamou a movimentação de tropas russas na fronteira de uma provocação inaceitável. No dia anterior, a chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, havia ligado para Vladimir Putin e apelado por uma desescalada da situação.
Segundo observadores, o Ocidente ainda está tentando entender o que Moscou quer com a movimentação de tropas, neste que pode ser primeiro grande desafio político internacional para o governo Joe Biden, com EUA e, sobretudo a União Europeia, imersos na crise associada à pandemia. Desde o início do mês, as mídias sociais russas estão tomadas por imagens de carros blindados cheios de soldados, alinhados no perto da fronteira, de tanques estacionados às margens das principais estradas, de artilharia pesada sendo transportada por trem.
De acordo com a inteligência americana, a movimentação é tratada como o maior deslocamento das tropas russas em direção à fronteira com a Ucrânia em sete anos, quando começou o conflito na região. Em 2014, pouco após a anexação da Crimeia por Moscou, forças ucranianas e os separatistas pró-russos iniciaram uma batalha por território no leste da Ucrânia. Mais de 14 mil pessoas foram mortas nos combates, que tiveram poucos momentos reais de trégua. Os esforços de negociação para uma solução política vivem atualmente um impasse.
Escalada militar e retórica O Kremlin disse na sexta-feira que teme uma retomada dos combates em larga escala no leste da Ucrânia e que poderia tomar medidas para proteger civis russos na região, um alerta interpretado pela diplomacia ocidental como uma ameaça grave. A declaração do porta-voz do presidente russo, Vladimir Putin, reflete a determinação do Kremlin em impedir a Ucrânia de usar a força para tentar retomar o controle sobre o território controlado pelos separatistas no leste da Ucrânia.
O chefe militar da Ucrânia, por sua vez, descartou as alegações russas de que suas forças armadas estejam se preparando para um ataque contra o leste rebelde. Desde o início do conflito, em 2014, Ucrânia e Ocidente acusam a Rússia de enviar tropas e armas para ajudar os separatistas, acusações que Moscou rejeita. A Casa Branca diz que a Rússia, em sete anos, nunca teve tantas tropas na fronteira.
Há sete anos, a Rússia também alegou que tinha que proteger os russos na Crimeia quando enviou tropas para a península do Mar Negro e depois a anexou, em março de 2014, na sequência de um controverso referendo. O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, disse na sexta-feira, depois de visitar as tropas no leste,. que 26 soldados ucranianos foram mortos em 2021. As violações cada vez mais frequentes de um acordo de trégua feito julho, afirmou ele, significam “novamente a necessidade de estabelecer uma nova trégua”. As autoridades separatistas em Donetsk disseram que 20 soldados e dois civis foram mortos neste ano.
Ocidente acompanha com apreensão – Autoridades ocidentais e ucranianas levantaram preocupações nas últimas semanas sobre violações cada vez mais frequentes do cessar-fogo no coração industrial do país. Eles também expressaram preocupação com a formação de tropas russas ao longo da fronteira com a Ucrânia.
As preocupações se intensificaram na sexta-feira, quando o secretário de Estado americano, Antony Blinken, falou com os governos em Paris e Berlim sobre a necessidade de a Rússia cessar seu movimento militar e abrandar a retórica de conflito. Em telefonema para Putin na quinta-feira, Merkel instou a retirada das tropas a fim de se obter uma desescalada da situação. Peskov disse que a Rússia é livre para enviar suas tropas para onde quiser em seu território. Ele acusou os militares ucranianos de uma “escalada de ações provocatórias” ao longo da linha de controle no leste, que estaria ameaçando a segurança da Rússia.
“O Kremlin teme que uma guerra civil possa ser retomada na Ucrânia. E se uma guerra civil, uma ação militar em larga escala, recomeçar perto de nossas fronteiras, isso ameaçaria a segurança da Federação Russa”, disse Peskov. “A contínua escalada de tensões é sem precedentes”. Em Kiev, o general Ruslan Khomchak, o comandante-em-chefe das forças armadas da Ucrânia, rejeitou as reivindicações de Moscou sobre os supostos preparativos ucranianos para uma ofensiva no leste como parte de uma “campanha de desinformação” e de uma “guerra híbrida”.
Os militares russos, por sua vez, disseram que seus aviões de guerra treinaram para missões além das linhas inimigas durante os últimos exercícios na região de Belgorod, que faz fronteira com a Ucrânia. E no Mar Negro, os barcos de guerra da Marinha russa treinaram atingir navios inimigos em eventual ataque.
Kremlin: “Início do fim da Ucrânia” – Dmitry Kozak, assessor de Putin que serve como principal negociador da Rússia com Kiev, advertiu na quinta-feira a Ucrânia contra o uso da força para retomar o controle do leste, onde muitos residentes têm a cidadania russa. Tal movimento marcaria “o início do fim da Ucrânia”, disse ele, acrescentando que a Rússia provavelmente agiria para proteger seus cidadãos.
Indagado sobre o comentário de Kozak, Peskov alegou que a retórica nacionalista virulenta na Ucrânia inflama o ódio contra a população de língua russa do leste. Ele disse que, se os civis no leste da Ucrânia enfrentarem a ameaça de um massacre, “todos os países, incluindo a Rússia, tomarão medidas para evitar uma tragédia”. Um funcionário do Ministério do Exterior disse na sexta-feira que os EUA notificaram a Turquia que dois navios de guerra americanos navegarão para o Mar Negro nos dias 14 e 15 de abril e lá permanecerão até 4 e 5 de maio. O diplomata falou sob condição de anonimato.
Movimentos como esse dos EUA e de outros navios da Otan têm irritado Moscou, que acompanha com atenção os esforços da Ucrânia para construir laços de defesa com o Ocidente e suas aspirações de eventualmente aderir à Otan. A porta-voz do Ministério do Exterior russo, Maria Zakharova, advertiu na sexta-feira que a adesão da Ucrânia à Otan “não só levaria a uma escalada da situação, como também poderia acarretar consequências irreversíveis para o Estado ucraniano”.