Indústria automobilística e setores de alumínio e aço devem perder mercado nos dois países devido a algumas exigências, como índice de conteúdo nacional dos produtos e necessidade de compra de insumos em nações da América do Norte
Correio Braziliense
Os efeitos para o Brasil do acordo comercial entre os Estados Unidos e o México ainda são incertos, avaliam especialistas. Alguns alertam para eventuais prejuízos nas exportações brasileiras de autopeças, motores, aço e alumínio para os dois países, além de a medida frear a possibilidade de entendimentos comerciais entre o Brasil e o México, discutidos há anos. Entretanto, a falta de clareza sobre os termos do tratado, a necessidade de aprovação pelas casas Legislativas dos dois países e a falta de participação de negociadores do Canadá podem prejudicar o processo.
Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, como os mexicanos sofreram uma dura derrota na negociação com os Estados Unidos, isso pode atingir empresas brasileiras. A elevação do índice de conteúdo regional nos produtos, que passa de 62,5% para 75% para a venda de automóveis sem tarifa afeta negativamente o Brasil. As exportações brasileiras de veículos, partes e peças devem ser comprometidas tanto para o México quanto para os EUA. A proposta em debate pelos dois países também estabelece que alguns insumos de aço e alumínio para a indústria automobilística deverão ser comprados de países da América do Norte.
De janeiro a julho, as vendas brasileiras para o México encolheram 3,5% em relação ao mesmo período do ano passado. Entretanto, Castro ressaltou que a exportação de motores para automóveis cresceu 116%. Com a alta, esse item se tornou o principal bem da pauta de comércio do Brasil aos mexicanos e totalizou US$ 311,9 milhões.
Em comparação com o mesmo período do ano passado, tanto a venda de veículos quanto a de partes e peças recuaram 68,1% e 6%, respectivamente. Nos primeiros sete meses de 2017, o Brasil exportou para o México US$ 310,9 milhões em veículos, ante US$ 99 milhões deste ano. Os negócios de partes e peças somou R$ 95,8 milhões de janeiro a julho de 2018.
Prejuízo
O prejuízo só não será maior, segundo Castro, porque a participação do México nas exportações totais do Brasil é relativamente baixa. Nos primeiros sete meses deste ano, os embarques para aquele país somaram US$ 2,5 bilhões, enquanto que o total das vendas brasileiras ao exterior chegou a US$ 136,5 bilhões.
Na avaliação do consultor e ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Rubens Barbosa, o acordo bilateral entre Estados Unidos e México não marcará o fim do Nafta, apenas dará uma nova roupagem, sem impacto maior para o mercado brasileiro. “O Trump resolveu, sobretudo, a questão do setor automobilístico e depois fará um acordo bilateral com o Canadá. Uma guerra comercial mais ampla fica afastada e está limitada aos EUA e a China”, avaliou o diplomata. Ele lembrou que o governo norte-americano chegou a um entendimento com a União Europeia. “Na prática, o Nafta não muda. Trata-se de uma característica do governo Trump, que quer acordos bilaterais”, resumiu.
Na avaliação do advogado Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, o impacto no mercado brasileiro do acordo entre os dois países não deve ser forte, mas pode atingir algumas empresas de autopeças e aço. “Para a exportação total do Brasil, o impacto pode não ser grande, mas algumas empresas devem ser afetadas. Entretanto, o interesse do México em fechar um acordo com o Brasil pode diminuir. Esse tema está em debate há muitos anos e seria vantajoso, porque são duas nações por características semelhantes. Isso reforça o desafio brasileiro de fechar mais acordos comerciais e aumentar as exportações”, disse.
Termos
A proposta preliminar entre os dois países substituiria o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta), que ainda tem como signatário o Canadá. Em vigor desde 1994, o tratado de livre-circulação de mercadorias e serviços entre os três países da América do Norte levou a corrente de comércio regional a US$ 1 trilhão no ano passado.
Senadores dos Estados Unidos, entre eles membros da Comissão de Finanças, questionaram se a negociação com o México cumpre ou não os requisitos da Autoridade de Promoção Comercial dos Estados Unidos (TPA), autorização concedida pelo Congresso ao governo americano para negociar pactos comerciais.
O senador Ron Johnson, do Partido Republicano que preside a Comissão de Segurança Nacional e Assuntos Governamentais do Senado, avaliou que seria difícil um acordo bilateral ter aprovação no Congresso. “Acho que isso seria quase impossível. Tudo o que podemos fazer é consertar o Nafta e mantê-lo como um acordo tripartite. Acho que antes de tudo devemos querer isso”, disse. O líder da oposição democrata no Senado, Chuck Schumer, afirmou que espera mais detalhes sobre o acordo fechado com o México.
A proposta sobre o acordo deverá ser apresentada pelo governo Trump na sexta-feira ao Congresso, com o intuito de que o tratado possa ser assinado antes do término do governo de Enrique Peña Nieto, atual presidente do México. Se o prazo for cumprido, as novas regras do acordo comercial poderiam entrar em vigor no segundo semestre de 2019.
O presidente eleito, Andrés Manuel López Obrador, toma posse em 1º de dezembro e já deixou claro que o Canadá tem de fazer parte das negociações. A ministra de Relações Exteriores do Canadá, Chrystia Freeland, interrompeu uma viagem que fazia à Europa e chegou a Washington ontem para retomar as negociações sobre um acordo comercial com os EUA. O governo canadense, no entanto, tem afirmado que só assinará o pacto se for vantajoso para os trabalhadores e a classe média do país.