Ao celebrar sua 50ª edição neste ano, o evento criado por Klaus Schwab em 1971 consolida a forma que vinha tomando nos últimos anos, com líderes nacionais e empresariais de cinco continentes circulando entre ativistas, artistas, acadêmicos e outros representantes da sociedade civil.
A participação da ativista ambiental sueca Greta Thunberg, 17, em três sessões do evento sela essa transformação. Depois de dois anos de estreia presidencial no evento, um com Michel Temer (MDB) e outro com Jair Bolsonaro (sem partido), o Brasil baixou a graduação de sua comitiva, que será chefiada pelos ministros Paulo Guedes (Economia) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde), ladeados por parte da equipe econômica.
A missão de Guedes será apresentar aos investidores dados que possam convencê-los de que o Brasil engrenou um novo ciclo de crescimento. Gustavo Montezano, presidente do BNDES, que tem destacado a importância das parcerias internacionais, faz sua estreia em Davos. Também acompanha a comitiva, Wilson Ferreira Júnior, presidente da Eletrobras, a estatal que encabeça a lista de privatizações do governo.
Dois aspirantes ao Planalto, porém, comparecerão – o governador de São Paulo, João Doria (PSDB) e o apresentador Luciano Huck falarão ao público na quinta (23), o primeiro sobre cidades do futuro e o último sobre a ebulição das ruas da América Latina.
Sem o presidente, a lista de empresários e executivos brasileiros também minguou, resumindo-se quase que a presidentes de bancos. A comitiva da área financeira brasileira conta com Itaú Unibanco, Bradesco, BTG Pactual e Safra. Mas não foi só Bolsonaro que abriu mão do convite.
A lista de chefes de Estado e de governo neste ano está bem mais magra do que em seu auge, 2018, quando as calçadas escorregadias do resort de esqui de 11 mil habitantes que inspirou Thomas Mann a escrever “A Montanha Mágica” (1924) foram tomadas por mais de 70 comitivas de presidentes, premiês e monarcas. Desta vez, serão 43, sendo 25 delas de europeus.
Com a adesão de última hora do americano Donald Trump, aumentaram as expectativas e o quórum. Sua ida, anunciada no início da semana, permanecia nos planos da Casa Branca e da organização até o início deste sábado (18). Mas estando Trump em pleno processo de impeachment, não se pode ter certeza.
A viagem ao exterior neste momento é talhada para ser lida como sinal de confiança de que o processo naufragará em um Senado de maioria republicana, o que é mesmo mais provável. Concretizada, porém, sua presença em Davos pode causar saias-justas.Nos corredores acarpetados do centro de convenções o americano deve cruzar com (1) Greta, com quem mantém uma guerra verbal; (2) o vice-premiê chinês Han Zheng, com cujo governo trava uma guerra comercial em incipiente armistício; (3) o presidente iraquiano Barham Salih, cujo país foi usado pelos EUA como trampolim para uma quase-guerra com o Irã.
E (4) com o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, pivô da guerra política que Trump enfrenta em casa após virem à tona telefonemas em que exigia do europeu a cabeça de inimigos políticos para manter os aportes financeiros americanos a Kiev.Saia-justa é o que Bolsonaro parece evitar ao desistir do evento e reduzir a delegação logo antes de seu amigo americano confirmar presença.
Com as queimadas na Amazônia e os incêndios em curso na Austrália para mantê-las vivas no debate, o brasileiro seria inevitavelmente cobrado por sua inação ambiental, já que, sob o tema “Interessados em um mundo sustentável e coeso”, a ecologia e a sustentabilidade são o trilho principal do encontro neste ano (com saúde, trabalho, desigualdade social e os de praxe: negócios, tecnologia, geopolítica). E ainda poderia ter que ouvir um sermão de Greta, a quem definiu como “pirralha”.
É sintomático e estratégico, portanto, que esteja na delegação o cientista Carlos Nobre, presidente da Academia Brasileira de Ciência e respeitado pesquisador do aquecimento global, mas não o ministro do Ambiente de Bolsonaro, Ricardo Salles. O governo parece já ter suficientes escândalos com os quais lidar, e expor Salles a perguntas sobre a Amazônia de gente como Greta, Al Gore e o príncipe Charles não ajuda.
Nobre, por sua vez, foi escalado para três sessões oficiais sobre clima e ambiente. É o mesmo número da estrela da equipe, Paulo Guedes, que falará sobre indústria na terça, crescimento e inclusão social na quarta e dólar na quinta. O que faz Davos ter o peso que tem para definir a agenda de política e negócios do ano que começa, entretanto, é menos os palcos e mais seus corredores, que fervilham com encontros bilaterais.
O governador de São Paulo não ficou muito atrás. A agenda preliminar de Doria somava 17 encontros bilaterais com executivos e representantes de governo, além de almoços e jantares de negócios. Ao falar da viagem na sexta (17), o tucano alfinetou Bolsonaro ao dizer que é o único no Executivo do país a participar do evento três vezes seguidas.No vídeo para convencer investidores estrangeiros a colocarem dinheiro em São Paulo, nova cutucada: a produção elétrica que descreve o estado como ponto de convergência global mostra São Paulo praticamente independente do Brasil e seus problemas, e enfatiza o respeito ao Acordo de Paris sobre o Clima, que Bolsonaro desdenha e a nova cartilha empresarial ama.
O palco principal do evento, porém, não deve apresentar maiores emoções. Além de Trump e do vice-premiê chinês, os demais líderes a discursar ali serão o iraquiano Salih, a alemã Angela Merkel, que deixa a política no ano que vem, o espanhol Pedro Sánchez, que acaba de sobreviver a uma crise doméstica, o italiano Giuseppe Conte, o paquistanês Imran Khan e o príncipe Charles, num furacão familiar após seu filho caçula se afastar da realeza. Greta ainda não pisa ali -por ora.
“Veja os discursos” em www.weforum.org
Terça (21)
7h30: Donald Trump (EUA)
10h15: Han Zheng (China)*
Quarta (22)
7h: Pedro Sánchez (Espanha)
10h40: Pr. Charles (R. Unido)
11h30: Imran Khan (Paquistão)
14h: Barham Salih (Iraque)
Quinta (23)
10h15: Angela Merkel (Alem.)
12h: Giuseppe Conte (Itália)