O destino do primeiro-ministro iraquiano, Adel Abdel Mahdi, estava nesta quarta-feira nas mãos do Parlamento, que negocia sua renúncia, enquanto manifestantes reivindicam a queda do regime após protestos que deixam 240 mortos.
Concentrados na Praça Tahrir, em Bagdá e em várias cidades do sul, os manifestantes desafiaram o toque de recolher nas últimas duas noites e monitoram as manobras políticas, alertando que só aceitarão a saída total do governo.
O chefe dos paramilitares do Hachd al Shaabi no Parlamento, Hadi al Ameri, que até então apoiava Abdel Mahdi, declarou que concorda em trabalhar com o influente líder xiita Moqtada Sadr, que reivindica desde o início de outubro a renúncia do governo, que ele ajudou a formar há um ano.
Nesta quarta-feira, Al-Sadr pediu que Al Ameri tome uma decisão sob pena de “transformar o Iraque na Síria ou no Iêmen”, onde protestos contra o governo desencadearam uma guerra civil.
A situação de Abdel Mahdi, um político independente de 78 anos e sem base partidária ou popular, deve ser decidida no parlamento, em sessão aberta até nova ordem. O Parlamento pediu na terça-feira para se realize um voto de desconfiança. Abdel Mahdi não reagiu a essa recomendação até o momento.
– Voz das ruas –
Desde o início do movimento, em 1º de outubro, os manifestantes iraquianos não pararam de repetir que rejeitam qualquer manobra política. Para eles, a queda do governo não é suficiente.
É necessário renovar toda a classe política que chegou ao poder após a queda do ditador Saddam Hussein em 2003 e que não mudou desde então.
Eles dizem que querem acabar com o complicado sistema de distribuição de posições por confissão ou grupo étnico consumido pelo clientelismo e garantir que uma nova Constituição seja necessária.
Além disso, querem os “peixes grandes peixes da corrupção” devolvam o dobro do PIB do Iraque – segundo produtor da Opep – que, segundo eles, evaporou desde 2003 em um país considerado um dos mais corruptos do mundo.
Na Praça Tahrir, os manifestantes defendem a continuidade desse primeiro movimento social espontâneo pós-Saddam, mostrando sua determinação, apesar da violência.
Na primeira semana de protesto, de 1o. a 6 de outubro, foram 157 mortos (número oficial), e a maioria dos manifestantes foi baleada pelas forças estaduais, sem que ninguém tivesse sido preso.
Depois, as manifestações cresceram e as universidades, escolas e outras instituições paralisaram suas atividades.
A renúncia ou demissão de Abdel Mahdi foi “vista como um ponto de virada pelos manifestantes”, disse à AFP Maria Fantappie, do think tank do Crisis Group (ICG). “Mas isso pode marcar uma pausa invés do fim do movimento”, alertou.
Fantappie ressalta que “uma futura eleição com a mesma lei eleitoral traria as mesmas faces ao Parlamento e as mesmas negociações para encontrar um primeiro-ministro”, em uma assembleia fraturada.