[:pb]
por Beatriz Convertino
As “casas de café” surgiram no Velho Continente no século 18 e, de lá para cá, se tornaram indispensáveis no dia a dia dos europeus. Conheça as mais famosas, onde história e tradição estão presentes em suas mesas e em seus habitués
Excelência italiana Os italianos fizeram do café um patrimônio nacional, um diferencial levado tão a serio que resultou na criação doitalian coffe, que virou sinônimo de excelência. Grãos de procedências variadas passam por rigorosa seleção e resultam em misturas excepcionais. A torrefação no ponto certo garante aroma e sabor perfeitos. O rito do preparo resulta no famoso espresso (expresso) conhecido e apreciado no mundo inteiro.
Diferentemente dos brasileiros, os italianos não pedem simplesmente um café, mas uma das muitas variações consumidas no país: corto (puro), lungo (carioca), ristretto (concentrado), macchiato (pingado), corretto (com alguma bebida, geralmente o licor Sambucca), con spuma di latte (com espuma de leite), nel vetro (servido em copo de vidro) e por aí vai
O café nasceu humilde, por volta do século IX, no seio de antigas comunidades agrícolas que nele descobriram propriedades surpreendentes.
Segundo a tradição, foram as cabras dos rebanhos das tribos africanas as primeiras a sentirem esses efeitos, após comerem as frutinhas vermelhas do cafeeiro. Elas logo foram utilizadas em forma de infusão, importante aliado para enfrentar o duro cotidiano dessas populações: fornecia energia, combatia a fadiga e mantinha a mente mais desperta. Era o “Red Bull” dos pastores que se difundiu por todo o mundo árabe, de onde ganhou o resto do planeta.
De Constantinopla chegou a Veneza, depois à Inglaterra, à França e aos outros países da Europa. Graças à Companhia das Índias Ocidentais chegou à América Central e, posteriormente, ao continente sul-americano. Casas de café ou cafeterias se tornaram locais preferidos de intelectuais, escritores, políticos e artistas. No século passado, frequentá-las era um atestado de elegância e savoir vivre, inclusive entre as mulheres que consideravam o acesso a esses redutos, até então masculinos, uma vitória do feminismo. Até hoje ir a uma cafeteria para tomar um café e ler o jornal ou encontrar os amigos é um hábito comum a todos os europeus.
FOTO CAFÉ FLORIAN
Caffè Florian, Veneza
Entre os mais tradicionais da Europa, difícil concorrer com o Caffè Florian no item localização: Piazza San Marco, em Veneza. Fundado em 1720, o que faz dele a mais antiga cafeteria da Itália, é tão icônico e visitado quanto a Basílica di San Marco! Chamado inicialmente Caffè alla Venezia Trionfante (Café da Veneza triunfante) logo recebeu o nome atual, referência ao seu proprietário, Floriano Francesconi. De suas mesas ao ar livre, famosos e turistas comuns curtem o visual enquanto saboreiam um vero espresso (expresso verdadeiro).
A galeria de celebridades que se sentaram às suas mesas inclui Carlo Goldoni, Goethe, Marcel Proust, Lord Byron e Charles Dickens. Um de seus mais assíduos frequentadores, o sedutor Casanova tinha um motivo muito forte para fazê-lo: Floriano Francesconi havia conseguido uma licença especial do Doge de Veneza autorizando a entrada de mulheres neste domínio tipicamente masculino, permitindo-lhe assim conhecer e escolher suas próximas conquistas. Este fato é comemorado, com uma coleção de joias artesanais típicas da ourivesaria veneziana, produzidas e vendidas no próprio café.
O Florian mantém o luxo em seu interior, dividido em várias salas, batizadas com nomes simbólicos: Sala degli Uomini Illustri (Sala dos homens ilustres), Sala del Senato (Sala do Senado) e Sala degli Specchi (sala dos espelhos), entre outras. Atualmente estas salas são um espaço dedicado à arte contemporânea e a outras manifestações culturais. Uma orquestra permanente se encarrega do fundo musical. Seus preços estão à altura de seu status
FOTO CAFÉ DE LA PAIX
Cafe de la Paix, Paris
Aberto em 1862, elegantemente decorado em estilo Segundo Império, com belos afrescos e ornamentos em ouro, o Cafe de la Paix oferece ainda um terraço de onde se descortina uma vista privilegiada do Teatro Ópera-Garnier, em Paris. Por todo o século 19 e início do século 20, foi um dos palcos onde se desenrolou a vida mundana parisiense com todo o seu charme e um quê de boemia.
Toulouse Lautrec de sua mesa cativa observava o movimento de onde muitas vezes vinha a inspiração para algum quadro. Enrico Caruso durante as suas temporadas na Opera de Paris fez dele um de seus locais preferidos e Oscar Wilde talvez tenha buscado ali, em algum belo jovem francês, o modelo para criar o seu mais famoso personagem: Dorian Grey.
Hoje, como sempre, um de seus pontos fortes é a patisserie (confeitaria), comandada desde o início por grandes chefes. Atualmente, o Chef Pâtissier Dominique Costa ocupa o posto e é um dos responsáveis pela criação das famosas “Pâtisseries Fashion” du Café de la Paix; doces que são verdadeiras obras de arte. Aos domingos, de 12h15 às 15h30, oferece um delicioso brunch incluindo uma taça de champanhe rosé. É claro que todo este charme francês tem o seu preço, portanto prepare a sua carteira!
Café Central, Viena
Um verdadeiro símbolo vienense, aberto em 1860, o Cafe Central reuniu escritores, artistas e a alta burguesia da cidade até o final do século 19. Até hoje você pode deliciar-se com uma taça do melhor schawrzer (café puro forte), de um Kapuziner (café com chantilly) ou de um franziskaner (café claro com chantilly, servido em taça grande).
Sigmund Freud, Leon Trotzki e Gustav Klimt tiveram assento cativo em suas mesas. Durante muito tempo foi chamado “universidade do xadrez”, porque em suas mesas se disputavam grandes partidas entre os aficionados deste jogo. Sua decoração neorrenascentista se conserva praticamente inalterada, assim como a sua confeitaria que valoriza os sabores mais tradicionais e autênticos da pâtisserie austríaca, como o apfelstrudel (strudel de maçã)
Doce em homenagem a Gustav Klimt – Para comemorar o centenário de Gustav Klimt, que se comemora este ano, o chef Pierre Reboul do Café Central, em Viena, criou o Klimt Nuss Kuss (beijo de nozes Klimt), uma sobremesa especial, inspirada no quadro O Beijo. Preparada com chocolate ao leite e nozes, é uma homenagem ao seu famoso habitué.
FOTO CAFÉ IMPERIAL
Café Imperial, Praga
Aberto em 1914 no andar térreo do Art Deco Imperial Hotel, em um impressionante prédio estilo art nouveau no centro da cidade, o Cafe Imperial é muito próximo do centro histórico e da Praça Wenceslas. É ricamente decorado, teto e paredes recobertas de mosaicos com motivos de flores e animais, de inspiração oriental, abundância dos belos cristais da Boemia, painéis esculpidos e muitos bronzes. Sua trajetória de fausto e elegância na Praga então chamada de “Paris do Leste” foi interrompida por um doloroso hiato durante a Segunda Guerra Mundial, quando o exército alemão que ocupava a cidade fez do hotel o seu quartel general.
Completamente restaurado em 2007, hoje para os moradores da cidade nada é mais tradicional do que ir ao teatro Smetana e, depois do espetáculo, tomar um café acompanhado de deliciosos doces da tradicional pâtisserie checa, no requintado ambiente do Café Imperial. Na verdade, sentar-se em uma de suas mesas significa uma volta ao passado e um reencontro com os fantasmas de seus antigos habitués, quem sabe até com aquele de Franz Kafka
FOTO CAFÉ NICOLA
Café Nicola, Lisboa
O jornal A Gazeta de Lisboa em 1787 já fazia referência ao café fundado pelo italiano Nicola Breteiro, com o nome de Botequim Nicola, no bairro do Rocio. O Café Nicola foi o ponto de encontro da elite intelectual de Lisboa e palco de grandes debates literários e políticos. O poeta Manuel Maria Barbosa du Bocage foi talvez o seu frequentador mais famoso e lá ainda pode ser encontrado em uma escultura que o representa.
Com o passar dos séculos, o local soube adaptar-se aos novos tempos sem perder as suas características. Depois de um período em que foi obrigado a fechar suas portas, por problemas políticos, a partir de 1929, reformado, ganhou a fachada e o nome que se mantêm até hoje.
Atualmente, produz o seu próprio café e oferece um “algo mais” aos seus frequentadores: as séries especiais de “saquinhos de açúcar” originais e únicos, com dizeres diversos que fazem a alegria dos colecionadores de todo o mundo. Eleito pela Veja Lisboa como a melhor cafeteria da cidade, ainda permanece como importante referência na sociedade lisboeta e uma atração para os turistas
Café New York, Hungria
Foi inaugurado em outubro de 1894 como “o mais belo café do mundo”. Seu interior esbanjava mármore, bronze, cristais, afrescos, luminárias e estofados em seda e veludo em estilo eclético que se aproximava do barroco. Ponto de encontro da elite húngara, ali se reuniam os círculos culturais e mundanos de Budapeste. Era o lugar perfeito para discutir ideias, saber as últimas novidades e, muito importante, ver e ser visto.
Na década de 1910, além de seu público tradicional de intelectuais e jornalistas, foi ponto de encontro para cineastas como Alexander Korda, que então iniciava a sua carreira. A cidade chegou a ter 500 cafés entre 1910 e 1930. A deles maioria oferecia papel e tinta gratuitamente, além de um cardápio especial para escritores, a preço reduzido.
Conta-se que o escritor húngaro Ferenc Molnár, que fazia da sua mesa no café seu local de trabalho, pretendendo que o mesmo ficasse aberto durante 24 horas, se apoderou da chave da porta e jogou-a no Danúbio para que nunca fosse fechada. Grande parte desses locais foi destruída durante a Segunda Guerra, outros não sobreviveram ao regime comunista e às crises financeiras. A partir de 2006, inteiramente restaurado e com muitas peças autênticas recuperadas, o Cafe New York voltou a ostentar o luxo e o brilho de outros tempos.
Fonte: Viajeaqui
[:]