BBC Brasil
Um jornal americano, o New York Post, causou grande rebuliço na mídia americana ao noticiar que o ex-astro do basquete Dennis Rodman participaria do encontro entre o presidente dos EUA, Donald Trump, e o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, previsto para a semana que vem em Cingapura. Mas a diplomacia do basquete só pode funcionar mesmo com a Coreia do Norte, explica, para a BBC, o acadêmico especialista em Coreia do Norte Michael Madden:
Dennis Rodman tem a estranha distinção de ser o primeiro americano a ter se encontrado com Donald Trump e com Kim Jong-un. Ele foi duas vezes participante do reality show Celebrity Apprentice (Aprendiz Celebridade), que Trump apresentou, e viajou para a Coreia do Norte por cinco vezes. Ele até afirma ter dado a Jong-un uma cópia do livro A Arte da Negociação, de Trump.
Rodman também deu alguns pitacos sobre os dois homens. Em agosto passado, ele disse que a troca de provocações cheias de ameaças nucleares entre os dois líderes parecia a de “dois garotos grandes decidindo quem é o mais durão”.
A possibilidade de que ele participe do encontro em Cingapura é um lembrete de que não se trata apenas de um extravagante ex-jogador de basquete apelidado de The Worm (O Verme) tentando deixar sua marca em uma das relações geopolíticas mais estremecidas no mundo de hoje.
O basquete tem uma longa e importante história e significado para as elites da Coreia do Norte. Quando Rodman fez sua primeira viagem ao país, em 2013, ele não tinha ideia do quão importante era o esporte e seus embaixadores para os governantes locais.
Tribunais da NBA em toda a Coreia do Norte
Em 2000, a secretária de Estado dos EUA, Madeleine Albright, presenteou Kim Jong-il, pai de Kim Jong-un, com uma bola de basquete autografada por Michael Jordan. Atualmente, a peça é mantida na Exposição Internacional de Amizade da Coreia do Norte.
Foi um presente inteligente e, obviamente, irônico. O basquete é um dos símbolos mais potentes do soft power norte-americano, um esporte que a América pode justificadamente alegar ter “inventado” – um jogo americano profundamente americano. É sabido que Kim Jong-il adorou o presente.
É normal ver, em inúmeros vídeos da mídia estatal da Coreia do Norte, inclusive nos militares, uma quadra de basquete em segundo plano. O esporte também é praticado em locais de trabalho e de produção e tem destaque na programação de atividades em feriados.
No funeral de Kim Jong-il, muitos avistaram um norte-coreano excessivamente alto que muitos acreditam ser Ri Myung-hun, também conhecido como Michael Ri, um aposentado jogador norte-coreano de basquete. Ele é, tecnicamente, um membro do Exército. E o ministro de Segurança, Cho Bui-il, chefe da polícia norte-coreana, também era técnico de basquete.
É seguro dizer que o basquete é uma “coisa” na liderança da Coreia do Norte e pouco surpreende que o amor por basquete de Kim Jong-il tenha sido passado para o filho. Tem sido uma preferência pessoal do líder norte-coreano e, por isso, é um sinal de distinção na elite norte-coreana.
‘Diplomacia do basquete’
Dennis Rodman aterrissou na Coreia do Norte em 2013 com os Harlem Globetrotters, a famosa equipe de partidas de exibição do esporte, que jogou contra a seleção norte-coreana, tendo Kim Jong-un na plateia. Desde então, Rodman já foi várias vezes à Coreia do Norte – no que tem sido chamado de “diplomacia do basquete” – e disse que seu objetivo era “conectar dois países”.
O que é notável é como a televisão norte-coreana cobriu as visitas de Rodman. Ele conseguiu forjar uma “amizade” com o jovem líder norte-coreano. Uma de suas visitas ao país teve aproximadamente 30 minutos de cobertura em televisão estatal (isso é impressionante).
A famosa viagem de fevereiro de 2013, no jogo do Harlem Globetrotters, foi uma das raras vezes em que se pode ver um grande número de membros mais jovens da elite norte-coreana, de pessoas entre seus 20 e 30 anos. Era um sinal raro e seguro de que uma nova geração de líderes da Coreia do Norte estava presente e alerta.
Eles estão por todos os lugares, mas são praticamente invisíveis. Eles tendem a aparecer em público em eventos locais como inaugurações de estátuas.
Mas a presença deles no jogo dos Globetrotters era para associar a elite jovem norte-coreana a uma das mais modernas preferências coreanas, agora, no mesmo nível do taekwondo ou mesmo do futebol.
E Kim Jong-un, que teria 34 anos, segundo os dados mais confiáveis, é um líder jovem – Trump, aos 71, tem mais do dobro da idade do norte-coreano. Em 2014, Rodman levou mais jogadores de basquete da NBA para a Coreia do Norte e se encontrarem com King Jong-un
Portanto, a provável ida de Dennis Rodman a Cingapura vai ao encontro dos gostos pessoais de Kim Jong-un, as preferências de longa data da liderança norte-coreana e será vista com bons olhos pelos millennials da elite, que esperam nos bastidores essa inevitável mudança geracional.
Então, o que Rodman poderia fazer?
Como um homem que fez várias viagens, que esteve com Kim Jong-un em várias ocasiões, que professou sua amizade e respeito pelo líder, a presença de Rodman na reunião pode ter uma importância diplomática significativa.
Ele poderia fazer uma aparição em algum tipo de evento cultural como convidado especial. Trump e Kim definitivamente mantêm amizade com ele. E levando em conta que Rodman esteve no jantar de Trump com o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, no Japão, a possibilidade do ex-jogador participar da cúpula em Cingapura é plausível.
Rodman funcionaria como uma espécie de embaixador da boa vontade. Se os lados chegarem a um acordo sobre algum um tipo de intercâmbio cultural, Rodman poderia ser um papel nisso.
No mundo de Trump e Jong-un, que dão grande peso a relacionamentos pessoais, o protocolo significa pouco. E em Rodman, onde muitos veem um palhaço, eles enxergam apenas um amigo.